domingo, 20 de dezembro de 2015

A Folha mostra o legado social do PT que ela própria sempre escondeu. Por Paulo Nogueira




Demorou, mas antes tarde do que nunca.

A Folha, depois de anos de pesquisas e levantamentos da mais extraordinária inutilidade, descobre enfim o seguinte.
Vou usar as palavras do próprio jornal: “Em 13 anos de PT no poder, o Brasil distribuiu sua renda como em nenhum período da história registrada pelo IBGE. Todos ganharam. Quanto mais pobre, melhor a evolução. Foram 129% de aumento real (acima da inflação) na renda dos 10% mais pobres. Nos 10% mais ricos, 32%.”

Quer dizer: num país em que a desigualdade social é o maior e mais arraigado dos males, um real câncer, são números que merecem aplausos de pé.

Nenhum desafio para o país é maior do que o de reduzir a iniquidade. O abismo entre os poucos ricos e os muitos pobres é uma chaga muito mais deletéria do que a corrupção.
Quanto mais igualitária uma sociedade, menos corrupta ela é. Os países nórdicos estão invariamente na ponta nas listas de países com menor grau de corrupção, e o motivo é exatamente o igualitarismo. Você proporciona boa educação gratuita às crianças, ensina a elas noções vitais de ética, dá a todos boas oportunidades, protege os mais desfavorecidos e cria uma cultura segundo a qual praticar corrupção é um horror. Sonegar na Escandinávia, como faz abertamente a Globo, por exemplo, transforma você num pária.

Por mais pecados que o PT tenha cometido em 13 anos, e não são poucos, o fato de ter dado foco aos desvalidos o redime.

Você tira muitas conclusões dessa reportagem da Folha.

Uma é que isso – a redução – foi escondido estes anos todos, o que é um absurdo, quase um crime de lesa pátria, dado o tamanho abjeto e histórico da desigualdade.

Era algo que a Folha deveria ter feito na campanha de 2012, para ajudar seus leitores a entender melhor o que estava em jogo.

Outra é a inépcia do PT em se defender: como o partido não levantou, ele próprio, este tipo de coisa?

Estudos dessa natureza jogam luzes onde existem sombras, o que é a tarefa mais nobre do jornalismo.

Mas a imprensa brasileira faz exatamente o oposto, ou por má fé ou por incompetência: joga sombras até onde existe luz.

E então você entende o paradoxo do trabalho da Folha.

Mesmo com fatos acachapantes, apenas 31% dos brasileiros acreditam que sua vida melhorou nestes 13 anos de PT.

Ora, ora, ora.

Com o massacre cotidiano da imprensa sobre primeiro Lula e agora Dilma, a percepção das pessoas é que nestes 13 anos só houve corrupção.

Avanços sociais foram censurados numa mídia partidarizada, aparelhada pela direita e frequentemente desonesta.

E denúncias de corrupção, verdadeiras ou imaginárias, foram estupidamente ampliadas – não genericamente, mas contra um alvo específico: o PT.

Isso quer dizer o seguinte: é fácil, é simples explicar o paradoxo. As melhoras não são sentidas porque elas são soterradas por um noticiário envenenado.

E é exatamente pelo combate à desigualdade que a mídia – a voz da plutocracia predadora – tanto luta para derrubar o governo.

Não há propósitos moralistas na campanha da imprensa contra Dilma e Lula. O que existe é apenas a mesma lógica que a levou, no passado, a investir contra Getúlio e contra Jango.

A lógica das empresas de jornalismo é esta: defender seus interesses e os da classe que representa, a plutocracia.

Para sorte da sociedade, apareceu o jornalismo digital, com sites independentes e livres que funcionam como um contraponto potente ao esforço da mídia em manter o Brasil como um dos recordistas mundiais em desigualdade social.

Modestamente, nos orgulhamos de pertencer a este bloco de sites.

Em http://www.diariodocentrodomundo.com.br/a-folha-mostra-o-legado-social-do-pt-que-ela-propria-sempre-escondeu-por-paulo-nogueira/

sexta-feira, 4 de dezembro de 2015

GUERRA CONTRA A EDUCAÇÃO



O governador Geraldo Alckmin governa São Paulo como se aqui fosse um imenso cafezal adquirido por herança. Sua lógica não é muito diferente daquela própria aos antigos barões do café que tomavam decisões sobre a província de São Paulo em salões fechados, viam manifestações e greves como crime produzido por "arruaceiros" a quem a única resposta era o porrete da polícia e estavam mais preocupados sobre o que saia nos jornais do que como a população, de fato, recebia suas "medidas administrativas".

O governador pode vestir trajes de barão do café porque é beneficiário da "manemolência midiática" vinda de certos setores da imprensa. Isso significa que seu governo poderá ser julgado em processos no exterior por casos de corrupção no metrô, sua incompetência poderá produzir crises hídricas e racionamentos de água, seu governo poderá criar uma situação educacional classificada por seu próprio secretário da Educação como vergonhosa, mas nada disso se transformará em investigação implacável, como vimos várias vezes quando se trata dos desmandos do governo federal. Como um grande barão, ele irá pairar acima de suas próprias catástrofes.

Neste exato momento, seu governo aprova decretos que lhe permitirão fechar escolas, deslocando alunos para salas superlotadas e eliminando "salas ociosas", resultantes da fuga de professores e alunos do sistema estadual com sua qualidade falimentar. Há anos os profissionais de ensino público procuram denunciar os resultados de uma política que afugenta bons professores devido aos baixos salários, que não garante condições mínimas de ensino em escolas sucateadas, sem bibliotecas e infraestrutura. Ao invés de melhorar o sistema, ouvindo seus professores e alunos, ele resolveu diminui-lo para que ele caiba em um orçamento em queda. Em outros lugares do mundo, os governos lutam para abrir escolas. Aqui, o governo briga para fechá-las.

Como nosso barão do café assustou-se com o fato de os alunos não agirem passivamente como gado, sua Secretaria da Educação declarou preparar-se, vejam só vocês, para uma "guerra". Esta guerra envolveria, entre outras coisas, o esforço estatal em reverter o quadro negativo de notícias. Assim, enquanto decide o futuro de centenas de milhares de alunos soberanamente por decreto saído da cabeça de seus tecnocratas, sem sequer enviar seu projeto à Assembleia Estadual, o governo diz que são os alunos que "não querem dialogar". Enquanto manda sua polícia prender alunos, espancar professores e receber adolescentes com spray de pimenta, ele afirma que os manifestantes são violentos. Neste exato momento em que você lê este jornal, há alunos sendo tratados pela polícia como criminosos por se recusarem a aceitar a "reformulação" de suas escolas. Mas temo que nada disso irá realmente sensibilizar muita gente. Para um certo setor da população paulistana, como bem disse Jean Wyllys, fechar a Paulista é mais preocupante do que fechar escolas.

Como não poderia deixar de faltar, sobrou também para as universidades paulistas: "Não há nada mais corporativo do que a USP, Unicamp e Unesp", disse nosso governador nesta semana, talvez com medo dos professores universitários começarem campanhas para se solidarizar com os estudantes. Ou seja, se a situação das universidades de São Paulo é deplorável, não é porque elas triplicaram de tamanho com a mesma dotação orçamentária, nem porque seu partido impôs um reitor à USP que foi capaz de produzir déficits bilionários. A culpa, é claro, só poderia ser do "corporativismo" que não enxerga o maravilhoso trabalho de melhoria da educação pública feito por seus tecnocratas no Tucanistão. O filósofo dinamarquês Søren Kierkegaard costumava dizer que o pior defeito do ser humano é a transferência de responsabilidade. Meditemos.

Se me permitirem, gostaria apenas de lembrar ao governador que há sim algo mais corporativo do que nossas universidades. Basta que ele olhe para dentro de seu palácio de governo. Afinal, não seria seu partido algo mais parecido a uma corporação que acredita ter o direito censitário e eterno de nos governar sem nunca ter que ouvir, abrir a circulação efetiva de informações, responder por suas decisões equivocadas e rever processos a partir da pressão da população? Bem, mas para quem vê o Estado de São Paulo como um cafezal, as práticas de governo são outras.

(Fonte: FSP 04/12/15)

segunda-feira, 30 de novembro de 2015

Por que o Greenpeace não é valente lá nos EUA?


POR FERNANDO BRITO · 11/12/2014



O episódio do dano criminoso e imbecil causado por ativistas do Greenpeace (estrangeiros dirigindo e peruanos obedecendo) nas fantásticas linhas de Nazca, no deserto peruano ultrapassa qualquer simpatia que se possa ter pelas teses preservacionistas que dizem defender.

Porque não pode haver um grama de preservacionismo na mente de quem se dispõe a aparecer danificando um dos mais antigos e intrigantes monumentos humanos da América do Sul.

Só o que existe é marketing, a busca desesperada por uma notoriedade que rende, aliás, bons fundos para a organização.

Esta operação-imbecil, onde mais de uma dúzia de imbecis, sapatearam e remexeram uma área de acesso estritamente proibido pelo seu interesse arqueológico só produziu menos danos ali do que causou a quem defende com responsabilidade o meio-ambiente.

As desculpas do Greenpeace foram pífias. Dizer que “a atividade pareceu descuidada e ofensiva” é um nada.

Foi ofensiva e criminosa, isso sim.

Por que é que não vão dar o peito a bala e acabar com a caça que é permitida lá no país deles, os EUA? Ou com a mineração no Alasca?

É muito fácil defender cada árvore das florestas dos pobres, enquanto os ricos queimam petróleo e fazem emissões a rodo com hábitos perdulários que, aliás, são os primeiros a introduzir aqui.

Países ricos que se opõem a qualquer iniciativa global que considere que quem já devastou tudo nos últimos séculos não tenha de fazer sacrifícios maiores do que os “jardins do Éden” que sobraram na Terra. Desde a recusa dos EUA a assinarem o Protocolo de Kyoto até a recusa da proposta brasileira de escalonar as obrigações de redução de gases do efeito estufa para cada país em proporção a seu nível de desenvolvimento, só há boicote e sabotagem.

Muita gente que, de boa-fé, vibra com a ação de rapazes e moças que agem audaciosamente vai perceber, com esta monstruosidade que fizeram no Peru, o quanto há nisso de cobertura para que os grandes devastadores do planeta continuem a querer dar para os pobres as lições que eles próprios não seguem em casa.

segunda-feira, 23 de novembro de 2015

A DESLEGITIMAÇÃO DE GOVERNOS POPULARES É RECORRENTE NA HISTÓRIA BRASILEIRA

"Não é a primeira vez que grupos conservadores no Brasil se mobilizam para impedir a existência de um partido de base popular", diz a socióloga Maria Rita Loureiro, professora da FGV/SP
21 DE NOVEMBRO DE 2015 ÀS 07:57


Por Maria Rita Loureiro, via Carta Maior

Assistimos, hoje, ao processo sistemático e concertado de criminalização dos dirigentes do PT e a desqualificação da competência do governo de Dilma em conduzir as políticas econômicas. Procura-se, com isso, destruir o único partido político de base popular que assumiu o poder nesse país e que ousou realizar, mesmo de forma muito tímida, políticas de redução de suas seculares desigualdades sociais.

Por que a deslegitimação política do PT representa um traço estrutural na ordem social brasileira? Porque não é a primeira vez, e muito provavelmente não será a ultima, que grupos conservadores no Brasil se mobilizam para impedir a existência de um partido de base popular - não tutelado e com vínculos orgânicos com a classe trabalhadora. Como Faoro já mostrou, “o processo histórico brasileiro é recorrente e repetitivo, é uma sucessão de retornos de formas e de tempos que não passam de recondicionamentos de outros tempos”.

Vale relembrar alguns exemplos: o primeiro foi o que levou à ilegalidade do Partido Comunista em 1948, em plena ordem democrática, com base em argumentação jurídica bastante controversa, mas aceita então pelo STF. Portanto, legitimada juridicamente. O mais significativo é que isso ocorreu no Brasil enquanto outros países da América Latina, mesmo no contexto da Guerra Fria, mantinham seus partidos comunistas legalizados.

O segundo exemplo se refere à própria ascensão eleitoral de Vargas, em 1950. Mesmo seu trabalhismo autoritário era intolerável para as classes dominantes. Vale citar uma declaração de Carlos Lacerda, em seu jornal a Tribuna da Imprensa, lançando uma provocação histórica às Forças Armadas, quando Getulio estava prestes a se tornar candidato à presidência da república na sucessão de Dutra.

“O Sr. Getulio Vargas, senador, não deve ser candidato. Candidato, não deve ser eleito. Eleito, não deve tomar posse. Empossado, devemos recorrer à revolução para impedi-lo de governar” (Biografia de Getulio, de Lira Neto, vol. 3 p.188).

Como Vargas, nos anos 50, o governo do PT hoje, sessenta anos depois, também não pode governar. Essa memória nos ajuda a compreender em grande parte a crise política atual.

Há ainda outro ponto comum nesses dois momentos repetitivos da história brasileira: a elevação do salário mínimo, crucial no processo de redução das desigualdades sociais: da mesma forma que agora, os governos Lula e Dilma, elevaram sistematicamente o salário mínimo em termos reais (ajudando inclusive a alimentar o ódio contra o governo por parte da classe média, que quer ser “diferenciada” dos pobres), é importante relembrar que a campanha de Lacerda “contra o chamado mar de lama que atinge o Palácio do Catete” cresceu exatamente depois da elevação histórica de 100% do salário mínimo pelo governo Vargas em 1º maio de 1954.

O que resultará desse processo de destruição do PT? A despolitização da sociedade, a desqualificação da vida política, o retrocesso da ordem democrática e das conquistas sociais trazidas pela Constituição de 1988 que começaram, ainda que timidamente, a serem efetivadas pelas políticas sociais mais recentes. Pensem na frase que aparece nos discursos de certos economistas: “A Constituição de 1988 não cabe no PIB brasileiro”.

Mais ainda, o que está em jogo nesse momento é a capitulação mais completa do governo frente ao chamado “poder de fogo do mercado”. É o retrocesso da política externa brasileira, orientada por iniciativas como o banco dos BRICS e pela maior autonomia frente às potências hegemônicas e às suas corporações internacionais. E a possível reversão do sistema de partilha na exploração do pré-sal pela Petrobrás. É também o retrocesso na cooperação política e econômica entre países e forças democráticas de esquerda na América Latina.

Por fim, cabe alertar aos partidos de esquerda que imaginam recolher no futuro os espólios do PT: os exemplos históricos aqui trazidos permitem dizer que nada lhes garantem que eles também não serão objeto, se alcançarem o poder, do mesmo processo de aniquilamento que o PT hoje está sofrendo.

Socióloga e professora da área de Administração Pública e Governo da FGV/SP

quinta-feira, 19 de novembro de 2015

Judiciário brasileiro: caro e ineficiente

Custo Brasil



O Judiciário brasileiro, o mais caro do mundo, consome 1,2% do PIB nacional, mas seus integrantes querem mais privilégios e mordomias
por André Barrocal — publicado 06/11/2015 02h16, última modificação 06/11/2015 15h49


Caixa-preta é uma definição recorrentemente associada à Justiça brasileira, por conta do corporativismo que encobre os desmandos. Caixa-forte seria outro termo apropriado. Em 2014, o sistema consumiu 68,4 bilhões de reais em verbas públicas, o equivalente a 1,2% das riquezas produzidas pelo País no período. A conta inclui as repartições federais, estaduais, trabalhistas, eleitorais e militares. E não leva em conta o Supremo Tribunal Federal e seus 577 milhões de reais de orçamento. Trata-se do Judiciário mais caro do mundo, ou ao menos do Ocidente. E não se farta. Quer mais dinheiro, não para acabar com a ineficiência e a morosidade dos tribunais, mas para engordar contracheques desde sempre generosos.

O recorde de gastos está detalhado na pesquisa “Abrindo a caixa-preta: três décadas de reformas do sistema judicial do Brasil”, uma parceria entre Luciano da Ros, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, e Matthew Taylor, da Universidade Americana, de Washington. O trabalho completo só ficará pronto em 2016, mas Ros publicou uma prévia. Em “O custo da Justiça no Brasil: uma análise exploratória”, há uma comparação das despesas entre países. O gasto é de 0,32% do PIB na Alemanha, de 0,28% em Portugal, de 0,19% na Itália, de 0,14% na Inglaterra e de 0,12% na Espanha. Nos Estados Unidos, 0,14%. Na América do Sul, a Venezuela consome 0,34%, o Chile, 0,22%, a Colômbia, 0,21%, e a Argentina, 0,13%.

A folha de pessoal é a principal causa do altíssimo custo. No Judiciário, há gente e mordomias demais. O pagamento de 434.932 funcionários, entre juízes e servidores, mordeu 89,5% das despesas totais em 2014. O salário médio alcança 10,8 mil mensais. Apesar disso, a fatia de 1,2% no PIB é a mais baixa em seis anos, motivo, segundo Ros, de estar em curso uma ofensiva por mais recursos.

Servidores de tribunais cercam o Congresso há semanas em uma pressão pela derrubada do veto presidencial à lei que reajustava o holerite da turma entre 53% e 78%. Se a lei vigorar, o Judiciário ficará 5 bilhões de reais mais caro a partir de 2016. O custo dobrará de 2018 em diante. No mesmo Legislativo, avança um projeto do STF, datado de agosto, que reajusta em 16% o salário dos 11 ministros da Corte. As excelências passariam a receber 39.293 reais mensais. Detalhe: o salário dos ministros, hoje em 33.763 reais, foi corrigido há menos de um ano.

Aumentar os vencimentos do STF tem potencial para provocar um efeito dominó. Desde 2003, o salário dos ministros da corte é referência para a remuneração máxima no setor público. Na prática, a teoria é outra. A começar pelo próprio guardião das leis. Inúmeros são os subterfúgios usados para proporcionar à magistratura vencimentos acima do teto. Dados disponíveis na internet mostram gente ilustre a estourar o limite. O juiz Sergio Moro, da Operação Lava Jato, recebeu 82.370 reais em setembro. O presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros, José Ricardo dos Santos Costa, 41.262 reais. O da associação dos juízes federais, Antonio César Boechenek, 34.787 reais.

O pagamento acima do teto resulta dos chamados “penduricalhos”. Auxílios, indenizações, gratificações e uma penca de adicionais não definidas como “salário” e adotados do Oiapoque ao Chuí. No Rio Grande do Sul, paga-se um “auxílio-táxi” de 123,80 reais. Goiás instituiu em 2013 um “auxílio-livro” de 3,2 mil anuais. No Rio de Janeiro, há desde setembro um “auxílio-educação” de 953 reais por filho de juiz. Em 2011, o Conselho Nacional de Justiça, cuja missão é vigiar o Judiciário, criou um “auxílio- alimentação” e uma licença remunerada para cursos no exterior, entre outros.

Tudo serve de pretexto. No início do mês, o STF aprovou uma “diária” de 5,4 mil mensais a ser paga a 17 juízes que trabalham como auxiliares dos ministros. Justificativa: os magistrados precisam deixar seus lares para trabalhar. Durante a aprovação, o ministro Luiz Fux, com uma verve sindicalista, disse que “a magistratura é uma atividade espinhosa que merece valorização em relação a todas as outras categorias”.


O percentual de processos
O percentual de processos sem decisão chega a 71%. Créditos: Rodrigo Paiva/ Folha Press
Essa autoimagem do juiz nativo explica muito da proliferação dos penduricalhos. Os togados parecem se sentir cidadãos especiais. Em outubro de 2014, o presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, José Roberto Nalini, disse em entrevista à TV Cultura que só “aparentemente” o magistrado brasileiro ganha bem. “Ele tem de comprar terno, mas não dá para ir toda hora a Miami comprar terno, a cada dia da semana ele tem de usar um terno diferente, uma camisa razoável, um sapato decente, ele tem de ter um carro.” Um contraste com o entendimento em outros países. Entrevistado para o livro “Um país sem excelências e mordomias”, da jornalista brasileira Claudia Wallin, moradora na Suécia há 12 anos, Goran Lambertz, um dos 16 ministros da Corte Suprema sueca, disse que “luxo pago com o dinheiro do contribuinte é imoral e antiético”. Ao comentar os privilégios dos colegas brasileiros foi impiedoso: “É absolutamente inacreditável que juízes tenham o descaramento e a audácia de ser tão egocêntricos e egoístas a ponto de buscar benefícios como auxílio-alimentação e auxílio-escola para seus filhos. Nunca ouvi falar de nenhum outro país onde juízes tenham feito uso de sua posição a este nível para beneficiar a si próprios e enriquecer”.

A mordomia da moda é um auxílio-moradia de 4.377,33 reais mensais. Foi determinada pelo STF em setembro do ano passado, graças a uma liminar de Fux. Em abril de 2013, a associação dos juízes federais, a Ajufe, havia ingressado no Supremo com uma ação a favor do auxílio. Invocava isonomia. Se a benesse vigora para promotores e procuradores de Justiça, conforme uma lei de 1993, por que não para eles? Fux mandou pagar não só aos representados da Ajufe, mas a todos os magistrados, 16.927 em todo o País. Custo da liminar para o Erário: 900 milhões de reais por ano. Procurado via assessoria de imprensa do STF, Fux não se manifestou sobre o futuro da ação.

A liminar do ministro detonou um rastilho de pólvora. Dias depois, o Conselho Nacional do Ministério Público resolveu liberar o pagamento geral e irrestrito do auxílio-moradia a todos os seus integrantes. Um casal de procuradores recorreu ao Superior Tribunal de Justiça para receber um auxílio cada, apesar de morarem juntos. O pedido foi atendido provisoriamente pelo relator, Napoleão Maia, que entre outras justificativas invocou trechos da liminar de Fux. Um manifesto liderado pelo ex-procurador-geral da República Claudio Fonteles condena a “visão profissional estritamente mercantilista” por trás do auxílio-moradia e classifica este como tentativa de “ludibriar o teto constitucional”. “Auxílios, gratificações e modalidades outras de penduricalhos de tal jaez ofendem tratamento remuneratório democrático”, afirma o texto.


Filas lotadas, uma regra
Filas lotadas, uma regra. Créditos: Rodrigo Paiva/ Futura Press
Outro penduricalho na crista da onda é uma gratificação para juízes federais, trabalhistas e militares por acúmulo de função. O mimo é devido a quem assumir casos de um colega ou atuar em outra vara ou corte. Enriquecerá em até um terço o salário das excelências. A categoria arrancou a benesse na marra. Em setembro do ano passado, houve uma espécie de greve contra o acúmulo de processos. Semanas depois, o Congresso aprovou a gratificação, sancionada em janeiro por Dilma Rousseff.

A gratificação foi regulamentada em abril por uma resolução do Conselho da Justiça Federal, o CJF. E há quem tenha visto esperteza em excesso na resolução. Para o procurador da República Luciano Rolim, o CJF extrapolou os termos da lei e abriu a porteira para um juiz federal
obter ganhos iguais àqueles de um ministro do STF e mais 15 dias de férias, além da boa vida de 60 dias garantidos. Em um país com 99 milhões de processos encalhados, não seria o caso de reduzir as férias a 30 dias, regra para os demais trabalhadores, em vez de esticá-las?

Entre os procuradores da Advocacia-Geral da União, também há críticas às artimanhas do Judiciário contra o teto salarial. Há algumas semanas, o procurador Carlos André Studart Pereira, assessor da presidência da Associação Nacional dos Procuradores Federais, pesquisou os contracheques de vários juízes e concluiu: ultrapassar o teto é regra. “O subsídio dos magistrados é justo e merecido. Os arranjos institucionais, não”, afirma Pereira, para quem a diária aprovada pelo STF é “bizarra” e o auxílio-moradia, “patentemente inconstitucional”.

Discretamente, o governo se insurge contra os penduricalhos. Com as contas públicas combalidas, o Palácio do Planalto mandou em setembro ao Congresso uma lei para definir quais pagamentos precisam ser computados no cálculo do teto e quais podem ficar de fora. Polêmica à vista. Desde dezembro de 2014, o STF estuda uma nova Lei Orgânica da Magistratura Nacional, em substituição à
atual, de 1979. A minuta em discussão institucionalizaria vários penduricalhos.

Às vezes, estes não são apenas “patentemente inconstitucionais”. Beiram a quebra de decoro. Em 2009, o CNJ recebeu uma denúncia de que o Tribunal de Justiça de São Paulo pagava “por fora” juí-
zes que auxiliavam a elaboração de votos dos desembargadores. “Por fora”, no caso, permitia não recolher impostos à Receita e à Previdência, além de mascarar o estouro do teto. Apurar a denúncia não foi fácil. O presidente do TJ à época, Roberto Vallim Bellochi, mostrou-se pouco interessado em colaborar. Foi ao STF com um mandado de segurança, para não ter de prestar informações. Mesmo assim, o CNJ concluiu que houve irregularidades e determinou a suspensão dos pagamentos e a devolução do dinheiro. A corte paulista recorreu ao Supremo, comandado à época por Cezar Peluso, ministro que tinha um filho beneficiado pelo “auxílio-voto”. O relator da ação no STF, Dias Tof-
foli, concedeu uma liminar favorável ao TJ ainda em 2010. O processo está parado em seu gabinete desde 2013. Procurado via assessoria de imprensa do STF, Toffoli não se manifestou sobre o futuro da ação.

O caso do “auxílio-voto” é ilustrativo do que o advogado Marcelo Neves, ex-conselheiro do CNJ, relator do caso no conselho e hoje professor da Universidade de Brasília, chama de “corrupção sistêmica” no Judiciário. Para Neves, o CNJ abandonou o papel de “fiscal do fiscal”. Tornou-se “corporativista” e “capturado por um pacto mafioso existente entre os poderosos do Judiciário e do Legislativo”. Ignoraria faltas disciplinares dos magistrados graúdos, como aquelas do TJ paulista, para se ocupar de bagrinhos da primeira instância em lugares distantes. “O CNJ é hoje um órgão sem significado prático, principalmente no controle da corrupção, altíssima.”

Nancy Andrighi, Corregedora Nacional de Justiça, discorda. Segundo ela, não passam de 50 os processos relevantes que investigam desvios de conduta da magistratura, uma proporção pequena num universo de 16 mil juízes. “Posso concluir, assim, que a quase totalidade da magistratura brasileira é composta de juízes honestos e idealistas”, afirmou por escrito. Em dez anos de existência, o CNJ puniu 72 magistrados. A aposentadoria compulsória, pena mais dura, atingiu 46. Na verdade, pode ser considerada um prêmio. Pendura-se a toga, mas não se deixa de receber os vencimentos até o fim da vida, graças a um dispositivo constitucional.

Se os tribunais funcionassem, o pesado fardo financeiro até poderia não ser um problema. Não é o caso. “Nosso Judiciário é caro e não se reverte em serviços prestados. Ele não se vê como prestador de serviço público”, diz Luciana Gross Cunha, coordenadora do Centro de Pesquisa Jurídica Aplicada da Fundação Getulio Vargas de São Paulo. Essa postura, afirma, tem várias explicações. Uma cultura nacional que sempre enxergou a Justiça como apartada do Estado. Uma formação acadêmica exageradamente jurídica por parte dos magistrados. Juízes que parecem achar pouco digno preocupar-se com a administração.

A melhora da gestão seria a mudança mais urgente em um Judiciário à beira do colapso, acredita a acadêmica. Só no ano passado, 28 milhões de novas causas chegaram aos tribunais. A taxa de congestionamento, índice que indica quantos casos nunca tiveram qualquer decisão, chega a 71%. “O Brasil precisa de uma carreira de gestor jurídico, como os Estados Unidos fizeram há mais de cem anos”, diz Luciana Cunha. Infelizmente, as prioridades são outras.

*Reportagem publicada originalmente na edição 873 de CartaCapital, com o título "Caro e ineficiente"

quarta-feira, 4 de novembro de 2015

Por que não precisamos mais do FMI


Posted by eduguim on 03/11/15



Para quem acompanha a macroeconomia tupiniquim e sabe o que está acontecendo – e tudo o que já aconteceu – no Brasil, chega a ser torturante ver tanta desinformação sobre a verdadeira situação do país, que, apesar dos problemas atuais, é infinitamente melhor do que outrora.

Não é segredo para ninguém que, na melhor das hipóteses, 99% deste povo não tem quase nenhum conhecimento sobre macroeconomia, de modo que enganá-lo é extremamente fácil.

Nesse aspecto, caberia à imprensa traduzir nossa situação econômica para o povo em linguagem simples para que pudéssemos, inclusive, planejar melhor nossas vidas – nível de consumo, planos de investimentos etc. Todavia, devido ao fato de que a comunicação de massa no país é pautada por interesses políticos, a pílula econômica é dourada ou obscurecida conforme a conveniência dos grandes conglomerados midiáticos.

Eis que o Blog da Cidadania vem oferecer ao seu leitorado informações sobre a situação econômica do país valendo-se de uma linguagem acessível, apartada do economês, que, na prática, não passa de uma estratégia de enganação do homem da multidão que faz com que a maioria de nós nem tente ler o noticiário econômico.

Mas há uma coisa muito pior do que desinformação: os chutes de quem não entende nada de economia, mas, nem por isso, deixa de dizer bobagens como se soubesse o que está dizendo.

Quer um exemplo? Veja, abaixo, carta de um leitor da Folha de São Paulo na edição do jornal desta terça-feira (3/11).
economia

Uau! Onde estava o engenheiro Maurício Luz todo esse tempo, que não nos avisou dessa “saída” miraculosa? O FMI, então, é a solução, “a saída”?

Quanta abobrinha.

O que, diabos, o FMI tem que ver com o peixe? Nada. Mas o tal “engenheiro” associa a crise atual – que ninguém nega que existe – a recurso ao Fundo Monetário Internacional pelo simples fato de que, como se pode supor, não deve ser um garoto de vinte anos e, desse modo, passou a vida vendo o país recorrer ao organismo internacional ano após ano, por décadas.

Em 10 de janeiro de 2006, no último ano do primeiro governo Lula, o portal UOL trouxe uma notícia que só não foi suficientemente comemorada porque foi tratada com menoscabo pela imprensa: o Brasil acabara de quitar sua dívida com o FMI e, desse modo, não tinha mais por que submeter-se aos ditames do organismo multilateral.

Mas o que significava manter um acordo com o FMI? Reportagem do jornal Folha de São Paulo de 14 de novembro de 1998 (último ano do primeiro governo Fernando Henrique Cardoso) dá bem a dimensão do que significava ter um acordo com o Fundo – significava, na prática, que o país abdicava de poder tomar decisões soberanas sobre sua economia.

Confira:



Quanta diferença para a situação atual do país. Note, leitor, a verdadeira operação de salvamento internacional de que o Brasil vivia precisando, periodicamente, até o ínício deste século.

O Brasil precisava manter acordos constantes com o Fundo Monetário Internacional – o que implicava em ter que prestar contas ao organismo quase todos os meses e a adotar suas receitas massacrantes para o povo – porque precisava de dinheiro emprestado.

Para quê? Simples, para pagar o famigerado “serviço da dívida”, ou seja, os juros extorsivos que nos eram cobrados pelo mercado financeiro Internacional e que ultrapassavam, ao ano, a casa dos dois dígitos, enquanto que, hoje, como o país tem avaliação de crédito de que oferece baixo risco de dar calote, não temos que pagar nem metade do que pagávamos nas operações internacionais.

Poucos sabem, mas quando um industrial brasileiro compra no exterior uma máquina financiada, a taxa de juros que paga depende da nota de crédito do país.

Como, até 2002 ou 2003, o país tinha uma situação quase falimentar, qualquer operação de crédito que qualquer empresário fizesse com o exterior, implicava em juros escorchantes. Hoje, a situação é bem outra, apesar dos nossos problemas – incomensuravelmente menores do que àquela época.
Mas por que tínhamos que fazer “acordos” com o FMI daquele tipo que o pescoço faz com a navalha e, hoje, não temos mais?

A resposta é extremamente simples: porque não tínhamos reservas cambiais e devíamos até as calças ao resto do mundo, sobretudo ao FMI, ao Banco Mundial, ao tesouro norte-americano, ao Clube de Paris etc.

E como este artigo não se destina só a iniciados, há que explicar o que são reservas cambiais. Trata-se, basicamente, da quantidade de dólares que temos “em caixa”.

Voltemos, então, ao segundo dia de 2003, primeiro dia útil do primeiro governo Lula. Veja abaixo, leitor, o quadro que ele herdou de Fernando Henrique Cardoso em termos de reservas cambiais.

reservas 2003

Confira agora, abaixo, a situação em 30 de setembro de 2015.

reservas 2015

Eis por que o Brasil não precisa mais de acordos com o FMI. Claro, temos que equilibrar o orçamento federal – hoje, estamos gastando mais do que arrecadamos. Contudo, não há país nenhum (EUA) ou organismo internacional algum nos dizendo o que fazer, quanto cortar etc.

E como o que arde para esses governos estrangeiros e organismos internacionais, quando emprestam dinheiro a alguém, não é o deles, mas o daqueles aos quais emprestam dinheiro (sob juros escorchantes), eles exigiam cortes de gastos draconianos.

Essa “sutil” diferença entre as crises de antigamente e a de hoje é que permite que, em plena “crise”, possamos ver imagens como a que o Blog reproduz abaixo – o êxodo dos paulistanos rumo ao litoral paulista no último feriado e o bem-bom de que desfrutaram.

economia 2

sábado, 31 de outubro de 2015

Enem: A meritocracia e outras fábulas para ninar adultos

Do blog do Sakamoto



Leonardo Sakamoto

Passando perto de um local de realização do Enem, neste sábado, parei um pouco para ver o pessoal que seguia, cheio de pensamentos, para as salas de prova. Perto de mim, dois pais conversavam sobre o futuro de suas filhas e, claro, sobre o país. Não consigo reproduzir exatamente as palavras, mas a conversa foi mais ou menos esta:

– Nunca poupamos investimento na minha família para a educação. Educação sempre em primeiro lugar. A Paulinha, desde cedo, frequentou os melhores colégios, teve todos os livros que pediu, viajou para fora para ampliar a cultura…
– Se o Brasil fosse justo, um lugar em que o mérito fosse levado a sério, nossas filhas estariam com vaga garantida. Mas essas cotas distorcem tudo.
– É. Acaba entrando quem não merece, quem não se esforçou o bastante.

Sempre acho que essas coisas são pegadinha. Olho em volta, procuro câmeras escondidas, fico esperando surgir o Sérgio Mallandro e gritar “Rá! Te peguei!”. Mas, não. Ele nunca aparece.

Deu até vontade de, educadamente, perguntar se eles acreditam mesmo que a meritocracia é hereditária. E se crêem que suas filhas saíram do mesmo ponto de partida que outras pessoas às quais foram negadas todas as condições para poderem conseguir o melhor de si.

Pois, desse ponto de vista, quem tem o mérito maior: quem saiu do zero e, apesar das adversidades, conseguiu estar na média ou quem sempre teve todos os recursos à mão, mas avançou muito pouco, ficando um pouco acima da média?

Pois, se por um lado, as cotas garantem um acréscimo de condições para o candidato pobre, negro e/ou indígena, por outro a desigualdade social garante um acréscimo de condições para os candidatos mais ricos.

Contudo, reclamar do primeiro é “justiça” e, do segundo, “inveja”.

A “meritocracia” funciona em um debate como um coringa num jogo de buraco: quando falta carta para bater, ela aparece para salvar uma sequência incompleta. Não fica lá a coisa mais bonita do mundo, mas resolve sua vida porque todo mundo aceita que aquela carta pode preencher um vazio de sentido.

Não sou contra que competência e experiência individuais sejam parâmetros de avaliação. Mas muitas vezes não é o “mérito” que está sendo avaliado em um contexto que desconsidera fatores externos. Além do mais, uma coisa é o mérito em si e, outra, um sistema de poder criado em torno dele como justificativa para manutenção do status quo.

O problema é que o uso dessa palavra como verdade suprema acaba servindo a quem ignora que as pessoas não tiveram acesso aos mesmos direitos para começarem suas caminhadas individuais e que, portanto, partem de lugares diferentes. Uns mais à frente, outros bem atrás.

Há muita gente contrária a conceder benefícios para tentar equalizar as condições de recebeu menos sorrisos da sorte. Acreditam que a única forma de garantir Justiça é tratar desiguais como iguais e aguardar que as forças do universo façam o resto.

E esse discurso é tão bem contado que, não raro, são apoiados por pessoas que, apesar de largarem em desvantagem, venceram. “Tive uma infância muito pobre e venci mesmo assim. Se pude, todos podem.” Parabéns para você. Mas ao invés de pensar que todos têm que comer o pão que o diabo amassou como você, não seria melhor pensar que um mundo melhor seria aquele em que isso não fosse preciso?

Espero que ambas as filhas tenham ido bem no exame, se tiverem se dedicado para isso, claro. Mas, olhando como não conseguimos compreender os outros, pensamos primeiro em nossos umbigos e consideramos que sucesso diz respeito apenas ao esforço individual, penso que falta muito para deixarmos de ser uma espécie com tamanho nível de mesquinharia.

sexta-feira, 9 de outubro de 2015

A verdadeira oposição

Essa forma de se referir aos barões da mídia me parece estranha.
Chamar alguém de "folha" colabora com a estratégia daqueles que querem continuar agindo nas sombras. Por que não dar nomes aos bois e chamar o barão pelo nome?
O nome é Frias, não folha. O nome é Marinho, não Globo. O nome é Civita, não Veja.
Essa impessoalidade empodera os barões da mídia, cujas vozes são ouvidas na sociedade como se fossem a expressão de um deus onipresente e todo-poderoso.
Vamos dar nomes aos bois e mostrar a cara dessa plutocracia descarada, retrógrada e ridícula como toda oligarquia de republica bananeira.
O alarmismo não é da folha. É do Frias. O golpismo paraguaio não é da Rede Goebbels, é dos marinhos e dos civitas.
Mary Rose dos Santos

segunda-feira, 5 de outubro de 2015

O genocídio que o mundo esqueceu



A matança de mais de um milhão de oposicionistas na Indonésia contou com a benção dos EUA. Os responsáveis são da elite que governa hoje o país.

reprodução

São os grandes desaparecidos da Guerra Fria, o genocídio do Século XX, que quase ninguém recorda. Há 50 anos da matança de mais de um milhão de supostos militantes do Partido Comunista, a Indonésia vive uma assombrosa história de amnésia coletiva e lavagem cerebral, versão macabra de uma Macondo asiática que a tritura a verdade dos fatos como uma broca, fazendo com que os genocidas passem a ser heróis da pátria e os sobreviventes e familiares das vítimas vivam com medo de novas represálias.

O trabalho das organizações de direitos humanos e um alucinante documentário indicado ao Oscar estão começando a perfurar o muro de silêncio. Em novembro, um Tribunal Popular Internacional realizará uma sessão em Haia com uma palestra na que participarão nove juízes de destacada trajetória no campo dos direitos humanos, para avançar no reconhecimento nacional e internacional do genocídio “que contou com a cumplicidade das grandes potências ocidentais”.

O genocídio foi desatado com a intervenção do chefe do exército, o tenente-general Suharto, contra o governo populista do pai da independência nacional, Sukarno, com a desculpa de evitar que os comunistas tomassem o poder. No dia 5 de outubro de 1965, depois de conseguir o pleno controle das Forças Armadas, Suharto começou sua política de patrocinar grupos paramilitares e organizações criminosas, que começaram o trabalho de limpeza de comunistas em Jacarta e em toda a Java central, para depois se estender ao leste do país e à idílica Bali. Nesse arquipélago de três mil ilhas, com mais de cem grupos étnicos diferentes, e que tinha mais de cem milhões de habitantes naqueles Anos 60 – hoje são 255 milhões –, ninguém ficou alheio aos fatos.

Em meio à Guerra Fria e com o Vietnã como pano de fundo, a intervenção de Suharto contou com a benção dos Estados Unidos e do Reino Unido. A CIA negou qualquer tipo de vínculo com a matança, mas terminou admitindo que forneceu listas aos esquadrões da morte, através de uma tarefa na qual a embaixada estadunidense também estava envolvida. Num documento considerado “top secret”, revelado há poucos anos pela imprensa norte-americana, mostrava que o genocídio indonésio foi uma das grandes matanças do Século XX, equivalente às realizadas pelos soviéticos e pelo nazismo.

Sua magnitude é tão impressionante quanto o silêncio que veio depois. A pressão para um esclarecimento ganhou força em 2012, com o documentário do estadunidense Joshua Oppenheimer, “The Act of Killing”, e um primeiro relatório da Comissão de Direitos Humanos da Indonésia sobre o ocorrido, mas o poder da elite – a mesma que ainda hoje continua direta ou indiretamente vinculada ao fato – mantiveram o muro da impunidade erguido.

Durante a campanha eleitoral do ano passado, o atual presidente, Joko Widodo, prometeu que promoveria ações visando o esclarecimento dos fatos. Porém, uma vez eleito, relegou o tema a um segundo plano e propôs uma “solução permanente”, num trabalho em conjunto com a promotoria para buscar uma reconciliação, ou seja, eliminando a busca por verdade e justiça. Soe Tjen Marching, escritora indonésia e diretora do capítulo britânico do Tribunal Popular Internacional de Haia, acredita que somente uma campanha internacional levará o seu país a reconhecer o sucedido. “Querem uma reconciliação sem contar a verdade, sem que ninguém tenha que responder judicialmente. Ou seja, não querem justiça de nenhuma forma. A mesma sociedade indonésia está profundamente dividida. Os culpados não querem uma investigação que os faça descer do panteão dos heróis da pátria ao dos genocidas. Outros não querem agir por temor às consequências, o que afeta até mesmo alguns dos sobreviventes e familiares das vítimas”, disse ela à Carta Maior.

A reunião do Tribunal Popular Internacional, nos dias 12 e 13 de novembro em Haia terá um alto valor simbólico e político, mas chocará com uma elite que ainda domina as Forças Armadas, a polícia, a Justiça, o setor financeiro e parte do poder político parlamentar, provincial e municipal. Um dos comandantes que liderou o genocídio foi Sarwo Edhi Wibowo, cuja filha era a esposa de Susilo Bambang Yudhoyono, o presidente da Indonésia entre 2004 e 2014.

Essa mesma elite é quem maneja a versão oficial da história, através de um sistema educativo e editorial dedicado a perpetuar a amnésia coletiva. Em 2007, nove anos depois da queda de Suharto, e em meio a um julgamento por corrupção contra ele, o promotor geral Abdul Rahman Saleh vetou a distribuição e ordenou a queima de exemplares de 14 livros de história que não apresentavam o ditador como um salvador da nação, além de não responsabilizarem o Partido Comunista pelos fatos. Uma acadêmica indonésia da Universidade da Carolina do Norte, Paige Johnson Tan, analisou os textos de história publicados atualmente. “Desde a morte de Suharto (em 2008), não mudaram praticamente nada da versão histórica oficial”, escreveu ela recentemente.

Nesse hermético silêncio oficial, os documentários do estadunidense Joshua Oppenheimer tiveram um forte impacto, porque despiram a Indonésia perante o mundo. No primeiro deles, “The Act of Killing”, Oppenheimer mostra os assassinos e torturadores fazendo alarde dos seus crimes e voltando aos lugares onde ocorreram os fatos, para mostrar os detalhes (“a gente batia até matar, depois ficava tudo ensanguentado, então mudamos de método e passamos a usar arame”). A impunidade foi tanta que Oppenheimer ofereceu a Anwar Congo, um dos assassinos e fanático por cinema, a possibilidade de filmar versões de seus crimes em diversos gêneros (gangster, texto_detalhe, comédia e até musical), e ele aceitou participar das cenas, junto com alguns dos seus capangas, dirigindo e atuando. A cena final do filme é o apogeu macabro e surrealista, em forma de musical, com Anwar Congo sendo perdoado por duas de suas vítimas, que tiram os arames com os quais foram assassinadas e agradecem a ele por tê-las matado e enviado ao céu (assim mesmo, você não leu mal.)

Anwar Congo não é um devaneio dos pesadelos do passado. O genocida é um membro honorário da Pemuda Pancasila, uma organização paramilitar com três milhões de integrantes, uma das mais importantes entre as que atuaram no genocídio, entre 1965 e 1966, e que hoje conta com membros das Forças Armadas, da polícia, do parlamento, dos governos provinciais e municipais em suas fileiras. No filme, o grupo atua com total liberdade para exigir dinheiro e proteção de comerciantes chineses e vendedores ambulantes: o hoje ex-vice-presidente Muhammad Yusuf Kalla se refere aos seus membros como homens que sabem como usar a violência e que têm o direito de fazê-lo.

O documentário “The Act of Killing” foi aclamado mundialmente e indicado ao Oscar, mas não chegou a ser exibido nos cinemas da Indonésia, devido à censura – houve grande difusão em mostras de cinema privadas, além da decisão de Oppenheimer de publicar uma versão grátis em idioma indonésio no Youtube.

O segundo documentário estreou em Londres em junho, “The Look of Silence”. Nele, Oppenheimer mostra como os sobreviventes e os familiares das vítimas continuam sendo estigmatizados e perseguidos pelo Pemuda Pancasila. “É como se Hitler tivesse vencido a guerra e Himmler, um dos principais generais nazis responsáveis pelo Holocausto, fosse o herói nacional, o salvador da pátria”, comentou Oppenheimer à Carta Maior.

A busca pela justiça não será fácil. Além da resistência da elite, está o fato de que muitos dos responsáveis pelos assassinatos e muitas testemunhas dos fatos já faleceram. Segundo Soe Tjen Marching, o Tribunal Popular Internacional de Haia será um primeiro passo. “Espero que o governo peça perdão por esses crimes cometidos pelo Estado, e que admita que houve uma manipulação da história. Se o fizer, também terá que admitir que é preciso mudar a história que se ensina nas escolas e se publica nos livros, As vítimas terão que ser reconhecidas como vítimas e não como vilãs que receberam o que mereciam. É o que nós queremos”, indicou a escritora, em entrevista para a Carta Maior.

Tradução: Victor Farinelli

Composição do TCU

edição brasileira do Le Monde Diplomatique (a versão internacional mais chamada de “Diplo“) publica artigo esclarecedor – e estarrecedor para quem não conhece as cortes administrativas brasileiras – sobre o Tribunal de Contas da União que, na semana que vem, começa a julgar a contabilidade de 2014 do Governo de Dilma Rousseff.

O texto é de 2009, alertaram-me os leitores, o que o torna mais insuspeito de ser motivado por uma intenção de proteger Dilma Rousseff. Seu autor, que assina com o pseudônimo de João da Silva- o jornal se responsabiliza expressamente por ele – é, provavelmente, servidor ou ex-servidor do órgão, e narrava assim a composição do TCU:

“O TCU (…) é composto majoritariamente por indicados pelo Congresso Nacional entre ex-políticos e funcionários de carreira do Parlamento. No total, os seis integrantes estão assim dispostos: três membros do partido Democratas (DEM) – ministros Aroldo Cedraz (ex-deputado federal), José Jorge (ex-senador) e Raimundo Carreiro (ex-funcionário do Senado); um do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) – ministro Ubiratan Aguiar (ex-deputado federal); um do Partido Progressista (PP) – ministro Augusto Nardes (ex-deputado federal); e um do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) – ministro Valmir Campelo (ex-senador). Integram também o colegiado os três indicados pelo presidente da República: Marcos Villaça (nomeado diretamente por José Sarney); Benjamin Zymler (colocado na vaga de ministro-substituto pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso); e Walton Alencar (também recomendado por FHC na vaga do Ministério Público junto ao TCU). Estes dois últimos ingressaram no TCU por concurso público. “

Os ministros que eram parlamentares, lembra o texto, tiveram suas campanhas financiadas por empresas que tem as contas de obras que realizam ou realizaram para o governo julgadas ali: “O ex-senador José Jorge, por exemplo, teve como principal financiador de sua eleição em 1998 a CBPO Engenharia. Já o ministro Aroldo Cedraz, em sua campanha para deputado federal pela Bahia em 2006, recebeu recursos da empresa Norberto Odebrech, uma das maiores prestadoras de serviços ao governo federal”.

E mesmo os que não têm esta origem passam, ali, a ter grandes amizades.
“Recentemente, a Polícia Federal abriu investigação sobre a empreiteira Camargo Corrêa por suspeita de remessa ilegal, superfaturamento de obras públicas e doação irregular a partidos. Por duas vezes, a investigação esbarrou no TCU. A primeira, com o filho do ministro Valmir Campelo, Luiz Henrique, diretor de Relações Institucionais da Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp) e citado na operação como intermediário de supostas doações ilegais da empreiteira Camargo Corrêa para políticos. Valmir Campelo é relator da auditoria que investiga supostas irregularidades nas obras da refinaria do Nordeste, em Pernambuco, que tem participação da Camargo Corrêa. A segunda foi com o ministro Augusto Nardes: soube-se, via investigação da PF, que um funcionário da empresa, Guilherme Cunha Costa, atuou para que o ex-deputado Nardes fosse nomeado ministro do TCU, em 2005. Já no cargo, Nardes avaliou o contrato da Camargo Corrêa para a construção da eclusa da hidrelétrica de Tucuruí (PA) e permitiu à empresa obter um pagamento extra, maior que o previsto no contrato – de R$ 62 milhões, o adicional passou para R$ 155 milhões. “

João da Silva pergunta: quem controla essas decisões do TCU?

“Em tese, o peso e contrapeso (…) poderia ser exercido pelo Ministério Público junto ao TCU. Porém, o procurador-geral Lucas Furtado, que está há dez anos no cargo, expediu portaria em 2005 limitando a atuação dos demais procuradores e avocando para si a prerrogativa de interpor recurso em qualquer processo.”

Lá no TCU, o poder “é meu e ninguém tasca”…

sábado, 26 de setembro de 2015

O despudor golpista

“Uma vez me perguntaram se o Estado brasileiro é muito grande. Respondi assim: “Eu vou lhe dar o telefone da minha empregada, porque você está perguntando isto para mim, um cara que fez pós-¬doutorado, trabalha num lugar com ar¬-condicionado, com vista para o Cristo Redentor. Eu não dependo em nada do Estado, com exceção de segurança. Nesse condomínio social, eu moro na cobertura. Você tem que perguntar a quem precisa do Estado”.
Luiz G. Schymura.

“Não foi por decisão de Dilma que o gasto cresceu”, Valor, 07/08/2015

Duas coisas ficaram mais claras nas últimas semanas, com relação à tal da “crise brasileira”. De um lado, o despudor golpista, e de outro, a natureza ultraliberal do seu projeto para o Brasil. Do ponto de vista político, ficou claro que dá absolutamente no mesmo o motivo dos que propõem um impeachment, o fundamental é sua decisão prévia de derrubar uma presidente da República eleita por 54,5 milhões de brasileiros, há menos de um ano, o que caracteriza um projeto claramente golpista e antidemocrático, e o que pior, conduzido por lideranças medíocres e de discutível estatura moral.
Talvez, por isto mesmo, nas últimas semanas, a imprensa escalou um grupo expressivo de economistas liberais para formular as ideias e projetos do que seria o governo nascido do golpe. Sem nenhuma surpresa: quase todos repetem as mesmas fórmulas, com distintas linguagens. Todos consideram que é preciso primeiro resolver a “crise política”, para depois poder resolver a “crise econômica”; e uma vez “resolvida” a crise política, todos propõem a mesma coisa, em síntese: “menos Estado e menos política”.
Não interessa muito o detalhamento aqui das suas sugestões técnicas. O que importa é que suas premissas e conclusões são as mesmas que a utopia liberal repete desde o século XVIII, sem jamais alcançá¬-las ou comprová-¬las, como é o caso de sua crença econômica no “individualismo eficiente”, na superioridade dos “mercados desregulados”, na existência de mercados “competitivos globais”, e na sua fé cega na necessidade e possibilidade de despolitizar e reduzir ao mínimo a intervenção do Estado na vida econômica
É muito difícil para estes ideólogos que sonham com o “limbo” entender que não existe vida econômica sem política e sem Estado. É muito difícil para eles compreender ou aceitar que as duas “crises brasileiras” são duas faces de um conjunto de conflitos e disputas econômicas cruzadas cuja solução tem que passar inevitavelmente pela política e pelo Estado.
Não se trata de uma disputa que possa ser resolvida através de uma fórmula técnica de validez universal. Por isto, é uma falácia dizer que existe uma luta e uma incompatibilidade entre a “aritmética econômica” e o “voluntarismo político”. Existem várias “aritméticas econômicas” para explicar um mesmo déficit fiscal, por exemplo, todas só parcialmente verdadeiras. Parece muito difícil para os economistas em geral, e em particular para os economistas liberais, aceitarem que a economia envolve relações sociais de poder, que a economia é também uma estratégia de luta pelo poder do Estado, que pode estar mais voltado para o “pessoal da cobertura”, mas também pode ser inclinado na direção dos menos favorecidos pelas alturas.
Agora bem, na conjuntura atual, como entender o encontro e a colaboração destes economistas liberais com os políticos golpistas?
O francês Pierre Rosanvallon dá uma pista, ao fazer uma anátomo-¬patologia lógica do liberalismo da “escola fisiocrática” francesa, liderada por François Quesnay. Ela parte da proposta fisiocrático-¬liberal de redução radical da politica à economia e da transformação de todos os governos em máquinas puramente administrativas e despolitizadas, fiéis à ordem natural dos mercados. E mostra como e por que este projeto de despolitização radical da economia e do Estado leva à necessidade implacável de um “tirano” ou “déspota esclarecido” que entenda a natureza nefasta da política e do Estado, se mantenha “neutro”, e promova a supressão despótica da política, criando as condições indispensáveis para a realização da “grande utopia liberal”, dos mercados livres e desregulados.
Foi o que Rosanvallon chamou de “paradoxo fisiocrata”, ou seja: a defesa da necessidade de um “tirano liberal”, que “adormecesse” as paixões e os interesses políticos, e se possível, os eliminasse
No século XX, a experiência mais conhecida deste projeto ultraliberal foi a da ditadura do Sr. Augusto Pinochet, no Chile, que foi chamada pelo economista americano Paul Samuelson de “fascismo de mercado”. Pinochet foi ¬ por excelência ¬ a figura do “tirano” sonhado pelos fisiocratas: primitivo, quase troglodita, dedicou¬-se quase inteiramente à eliminação dos seus adversários e de toda a atividade politica dissidente, e entregou o governo de fato a um grupo de economistas ultraliberais que puderam fazer o que quiseram durante quase duas décadas.
No Brasil não faltam ¬ neste momento ¬ os candidatos com as mesmas características e os economistas sempre rápidos em propor e dispostos a levar até as últimas consequências o seu projeto de “redução radical do Estado”, e se for possível, de toda atividade política capaz de perturbar a tranquilidade de sua “aritmética econômica”.
Neste sentido, não está errado dizer que os dois lados deste mesmo projeto são cúmplices e compartem a mesma e gigantesca insensatez, ao supor que seu projeto golpista e ultraliberal não encontrará resistência, e no limite, não provocará uma rebelião ou enfrentamento civil, de grandes proporções, como nunca houve antes no Brasil.
Porque não é necessário dizer que tanto os líderes golpistas quanto seus economistas de plantão olham para o mundo como se ele fosse uma “enorme cobertura”, segundo a tipologia sugerida na epígrafe, pelo Sr. Luiz Schymura. Um raro economista liberal, em entender a natureza contraditória dos mercados, e natureza democrática do atual déficit público brasileiro.
1) P. Rosanvallon, Le liberalisme économique. Histoire de l’idée de marché, Editions Seuil, Paris, 1988
(Artigo inicialmente publicado no jornal ‘Valor Econômico’, no dia 26 de setembro de 2015)
José Luís Fiori é professor titular de economia política internacional da UFRJ, é autor do livro “História, estratégia e desenvolvimento” (2014) da Editora Boitempo, e coordenador do grupo de pesquisa do CNPQ/UFRJ

quinta-feira, 24 de setembro de 2015

Um canalha sobe 5.000% o preço de remédio nos EUA. Aqui, “mal” é o médico cubano grátis


POR FERNANDO BRITO · 24/09/2015



A matéria é o insuspeito Brasil Post, associado da Abril e o assunto está rodando na internet.

Os direitos de exploração nos Estados Unidos do Daraprim, droga utilizada no tratamento de malária e de infecções oportunistas da Aidsa foram comprados em agosto pela Turing Pharmaceuticals, startup dirigida por Martin Shkreli, ex-operador de ações de alto risco de 32 anos.

O preço do comprimido passou de US$ 13,50 para US$ 750, ou R$ 3 mil.

Segundo a Forbes, Shkreli ” é o homem mais odiado na América”, mas ele afirma não se importar.“A reação da mídia não é algo que eu levo muito a sério. Metade do país não gosta de empresas farmacêuticas. A outra metade do país não se importa “

Aqui no Brasil, país arcaico, atrasado, cheio de marcos regulatórios e intervenção do Estado, e controla (mais ou menos) o preço dos medicamentos, o Daraprim custa, em caixa de 100 comprimidos, R$ 7 — sete centavos por pílula –, o que corresponde a 0,002% do preço de um comprimido americano, segundo informa a repórter Ione Aguiar, do Brasil Post. E não há planos de subir o preço, porque a patente, aqui, não pertence ao “mauricinho”.

O assunto explodiu depois que, três dias atrás, o The New York Times fez uma matéria sobre os aumentos gigantescos de preço e sobre um tweet de Hillary Clinton que chegou a derrubar as ações das farmacêuticas na bolsa Nasdaq.

Aqui, a historinha sai sem destaque. Escarcéu, mesmo é para programa como o Mais Médicos, que deu atendimento a milhões de pessoas que não tinham nenhum, contra as carências do SUS e desprezo total pela pesquisa e produção de fármacos da Fiocruz e por sua luta para tornar a saúde uma concepção integral e não um monte de nichos lucrativos de mercado – remédios, planos privados de saúde e a ideia de que boa medicina é apenas alta tecnologia, como diz o o sanitarista Paulo Buss, coordenador do Centro de Relações Internacionais em Saúde da Fundação:

– Não interessa a alguns grupos que o Estado tenha força para intervir em absurdos como o acesso à tecnologia apenas a quem pode pagar.

segunda-feira, 7 de setembro de 2015

Na Guerra de trincheiras da velha mídia Aécio Neves é general 5 estrelas.


Alexandre Tambelli

A grande discussão sobre os meios de comunicação hegemônicos no Brasil que temos de enfrentar e de forma realística é:

Como querer imparcialidade se a velha mídia brasileira (Rede Globo, Folha, Estadão, Veja, Band & Cia.) deixou de ser um canal de comunicação de notícias de interesse da coletividade para se tornar um instrumento puro e simples de oposição ao Brasil e aos interesses da população brasileira?

Não adianta, a mídia oligopólica brasileira vive, atualmente, apenas para:

1) Defender a Ideologia de um grupo específico de agentes econômicos poderosos e que estão em toda parte do Planeta, apesar de representarem os interesses de menos de 1% da população mundial;

2) Cooptar um conjunto de políticos e agremiações políticas e um outro conjunto, o de aliados no Judiciário, que aceitem o papel de defesa de seus interesses em troca de blindagem, tratamento cordial e positivo dos seus atos administrativos e apoio eleitoral no caso dos políticos. Dá-se apoio ao Político, ao partido político e ao membro do Judiciário que aceitar como idêntico os seus interesses econômicos e uma forma que deva coexistir na sociedade o dominante e os dominados.

Com domínio de mais de 80% dos meios de comunicação que levam informação sobre o Brasil e o Mundo aos brasileiros ela, a velha mídia, detém um Poder de formar a opinião pública brasileira inimaginável.

Acaba, pois, fornecendo aos brasileiros, a visão de mundo, que lhe interessa e a colocar acima do papel primordial de um meio de comunicação: a notícia de interesse coletivo, a defesa intransigente de sua Ideologia econômica. Ela coloca como saudável o que interessa ao 1% como interesse dos 100% dos brasileiros. E acabamos todos enredados numa Guerra ideológica sem fim.

Pró e contra a Ideologia da velha mídia. Pró e contra os aliados dela. E não mais se busca a notícia na velha mídia, quando se aprende o que ela faz hoje de forma exclusiva: propaganda ideológica. Perdeu-se a razão de assistir, ouvir, ler a velha mídia para milhões de brasileiros.

Afinal a velha mídia não faz mais Jornalismo.

Ela não separa mais a Ideologia nem da Informação mais comezinha e nem da informação que a todos beneficia. Não separa mais o interesse particular da notícia. Não respeita mais sequer a pessoa, se esta for de outra Ideologia, mesmo sendo a pessoa a mais honesta pessoa do mundo. Tudo se restringe a olhar se uma pessoa está a lhe obedecer, a seguir seu manual de instrução (o da velha mídia), a ajuda-la a implementar os interesses econômicos que defende ou não.

A velha mídia não olha os atos das pessoas mais. Olha o que ela defende, qual a Ideologia que ela pratica. Se a pessoa faz o que estes meios de comunicação defendem/representam/tem interesse ela os deixará em paz, independente de ser desonesta e do grau de desonestidade da pessoa, aqui pode ser um Político, um membro do Judiciário ou um funcionário do setor administrativo de um Governo aliado.

Porém, o radicalismo é tão grande na velha mídia, que não há tréguas nem para um agrupamento de políticos/administradores que a sua política econômica aumenta juros, faculta lucros homéricos a bancos, coloca um Ministro da Economia totalmente ligado, de muitas formas, à Ideologia e aos interesses econômicos que a velha mídia defende. Por quê?

Porque a velha mídia só aceita a receita exata que ela possui de intervenção na sociedade: o Estado mínimo e a submissão dos governantes aos ditames do Capitalismo Financeiro Internacional sem tréguas. Tudo nela se tornou uma intransigência irrefreável.

Nela não há espaço para se pensar na existência de uma sociedade menos desigual e com equilíbrio dos lucros numa divisão mais igualitária dos rendimentos do trabalho e nem sequer de hegemonia do capitalismo industrial sobre o capitalismo financeiro.

A nossa velha mídia (metaforicamente) se tornou um conjunto diminuto de países com exército poderoso e com armamentos de ponta em Guerra contra muitos outros países com exército arcaico. Está de um lado da trincheira e faz qualquer coisa para derrotar seu inimigo, porque numa Guerra não há limites, há àqueles que se precisa destruir, porque são de outra cor a bandeira, a ideologia e o modelo de sociedade ideal.

Não adianta a gente ficar sonhando nem com o apreço e respeito da velha mídia, ao menos, pelo ser humano (telespectador) que se aceita capaz de lhe dar audiência.

Ocultar a denúncia do Youssef contra o Aécio Neves é parte integrante desta Guerra. Aécio Neves faz o que a velha mídia quer, e poupado será sempre. Aécio Neves aceita agir em prol dos interesses ideológicos e econômicos da velha mídia. Ele é um General 5 estrelas da velha mídia. E por isto, somente fora da velha mídia brasileira se pôde ver, em manchete, a notícia mais importante da semana.

Quando a velha mídia perdeu a capacidade de separar a defesa intransigente de uma Ideologia econômica da prática do Jornalismo a notícia ficou em segundo plano. O centro do Jornalismo se deslocou do coletivo para o particular.

No decorrer dos anos do PT no Governo Federal foi sendo preparado o terreno para a Guerra.

A intransigência, o Jornalismo parcial e a radicalização no trato da notícia favorável só aos aliados de Guerra e contrária/negativa a todos os do outro lado da trincheira se tornou a marca registrada da vela mídia.

Seus jornalistas, comentaristas e aliados adentraram em um estado de espírito doentio, que acomodou as pessoas do lado da trincheira dos meios de comunicação em uma loucura, talvez, inconsciente de só enxergar erros nos governos Lula e Dilma, porque estes dois governos estão do outro lado da trincheira.

Aécio é o General 5 estrelas da trincheira da velha mídia. Dilma e Lula generais inimigos e numa paranoia mais abstrata eles seriam: generais vermelhos, revolucionários perigosos, comunistas infiltrados no Poder central e outras paranoias mais. Devem ser derrotados, são inimigos de Guerra ideológica.

Culminou que a sociedade brasileira foi contaminada por este vírus do Jornalismo dos erros, de trincheiras ideológicas, da intransigência contra quem não está defendendo 100% dos seus interesses e até da não notícia.

Hoje, estamos divididos. Aécio Neves representou (a) em 2014 e 2015 a redenção, a capitulação dos inimigos e a vitória da velha mídia; o PT, Lula e Dilma, os inimigos, a serem derrotados.

Hoje, as ruas representam inconscientemente a Guerra de trincheiras da velha mídia contra outras ideologias que não sejam 100% iguais a dela. As manifestações atuais da extrema-direita nasceram da intransigência da velha mídia, são resultados do não jornalismo ali praticado.

O ódio doentio contra os petistas ou defensores do Governo Dilma, contra LULA e as esquerdas, também, surgiram desta Guerra de trincheiras, da doentia paranoia de querer implementar à força e tornar hegemônico o modelo econômico que a velha mídia defende.

Qualquer Ética jornalística desapareceu, narrativas falseadas do Brasil surgiram aos montes, nenhuma lucidez se faz mais presente nestes meios de comunicação. É Guerra e as manchetes contra o inimigo são seus principais aliados, elas precisam estar 24 horas do dia em ação! Contra o inimigo não se admitem tréguas.

Por isto um General 5 estrelas não pode ser manchete, certo? Daria munição ao inimigo, se perderia uma batalha importante, e recuo considerável na ocupação do território inimigo. Aécio Neves poderá ser rebaixado de patente, esquecido, sendo alçado Geraldo Alckmin ao posto de General 5 estrelas, mas, nunca será abatido pelas manchetes.

O brasileiro foi escolhendo o lado na Guerra de trincheiras, e participa de cada batalha: nas ruas, na Internet, no lazer, no trabalho, em casa, em qualquer lugar. E em clima pesado de comunicação/interação e atitudes, infelizmente.

O triste desta Guerra é que nunca saberemos o atual estágio de desenvolvimento do Brasil, por meio destes grupos de comunicação hegemônicos no Brasil.

Podemos dizer: o Brasil de agosto de 2015 está para ser descoberto, jornalisticamente, assim, como o Brasil de antes e depois do PT.

O Jornalismo da Guerra de trincheiras é prejudicial por demais ao nosso País.

Não adianta mais querer modificar o quadro de dentro do sistema velha mídia nem de seus aliados e seguidores, porque eles se enredaram em uma realidade paralela, a da bolha maniqueísta, que descrevi outro dia e pode ser lido sobre ela neste link:

http://jornalggn.com.br/noticia/a-imprensa-e-a-bolha-maniqueista

A velha mídia está em Guerra contra o Governo Federal. Não adianta mais cobrar sensatez de quem vive em Estado de Guerra. A sobrevivência desta mídia é incerta, provavelmente, durará mais alguns anos e a sua sobrevivência se dará mantendo esta batalha interminável de jogar todos contra todos, de colocar-se ao lado de uns contra o interesse da imensa maioria.

Uma bolha resistente se vê e se fortalecerá, porém, não vamos vê-la explodir, apenas encolher-se até o último sobrevivente segurar uma já gasta vela acesa numa caverna, talvez, algum Jornalista mais realista que o rei da Rede Globo.

Veremos a bolha até tornar-se imperceptível, até um último suspiro, quando, este último sobrevivente sentindo-se só vai assoprar a vela, sair da caverna e render-se, o último soldado da fronteira inimiga!

E a Guerra será dada por terminada.

domingo, 16 de agosto de 2015

DADOS SOBRE GOVERNO LULA E DILMA



1. Lucro do BNDES:
2002 – 550 milhões
2013 – 8,15 bilhões

2. Lucro do Banco do Brasil
2002 – 2 bilhões
2013 – 15,8 bilhões

3. Lucro da Caixa Econômica Federal:
2002 – 1,1 bilhões
2013 – 6,7 bilhões

4 .Produto Interno Bruto:
2002 – R$ 1,48 trilhões
2013 – R$ 4,84 trilhões

5. PIB per capita:
2002 – 7,6 mil
2013 – 24,1 mil

6. Dívida líquida do setor público:
2002 – 60% do PIB
2013 – 34% do PIB

7. Produção de veículos:
2002 – 1,8 milhões
2013 – 3,7 milhões

8. Safra Agrícola
2002 – 97 milhões de toneladas
2013 – 188 milhões de toneladas

9. Investimento Estrangeiro Direto:
2002 – 16,6 bilhões de dólares
2013 – 64 bilhões de dólares

10. Reservas Internacionais:
2002 – 37 bilhões de dólares
2013 – 375,8 bilhões de dólares

11. Índice Bovespa:
2002 – 11.268 pontos
2013 – 51.507 pontos

12. Empregos Gerados:
Governo FHC – 627 mil p/ano
Governo PT – 1,79 milhões p/ano

13. Taxa de Desemprego:
2002 – 12,2%
2013 – 5,4%

14. Valor de Mercado da Petrobras:
2002 – 15,5 bilhões
2014 – 104,9 bilhões

15. Média de Lucro da Petrobras:
Governo FHC – 4,2 bilhões p/ano
Governo PT – 25,6 bilhões p/ano

16. Falências Requeridas em Média p/ano:
Governo FHC – 25.587
Governo PT – 5.795

17. Salário Mínimo:
2002 – 200 Reais (1,42 cestas básicas)
2014 – 724 reais (2,24 cestas básicas)

18. Dívida Externa em Relação às Reservas:
2002 – 557%
2014 – 81%

19. Economia do Mundo:
2002 – 13ª
2014 – 7ª

20. PROUNI – 1,2 milhões de bolsas

21.Salário Mínimo Convertido em Dólares:
2002 – 86,21
2014 – 305,00

22. Passagens Aéreas Vendidas:
2002 – 33 milhões
2013 – 100 milhões

23. Exportações:
2002 – 60,3 bilhões
2013 – 242 bilhões
24. Inflação Anual Média:
Governo FHC – 9,1%
Governos PT – 5,8%

25. PRONATEC – 6 Milhões de pessoas

26. Taxa Selic:
2002 – 18,9%
2012 – 8,5%

27. FIES – 1,3 milhões de pessoas com financiamento universitário

28. Minha Casa Minha Vida – 1,5 milhões de Famílias beneficiadas

29. Luz Para Todos – 9,5 milhões de pessoas beneficiadas

30. Capacidade Energética:
2001 – 74.800 MW
2013 – 122.900 MW

31Criação de 6.427 creches

32. Ciência Sem Fronteiras – 100 mil beneficiados

33. Mais Médicos (Aproximadamente 14 mil novos profissionais):
50 milhões de beneficiados

34. Brasil Sem Miséria – Retirou 38 milhões da extrema pobreza

35. Criação de Universidades Federais:
Governos do PT – 18
Governos do FHC – zero

36. Criação de Escolas Técnicas:
De 1500 até 1994 – 140
Governo FHC – 0
Governo PT – 214

37. Desigualdade Social:
Governo FHC – Queda de 2,2%
Governo PT – Queda de 11,4%

38. Produtividade:
Governo FHC – Aumento de 0,3%
Governo PT – Aumento de 13,2%

39. Taxa de Pobreza:
2002 – 34%
2012 – 15%

40. Taxa de Extrema Pobreza:
2003 – 15%
2012 – 5,2%

41. Índice de Desenvolvimento Humano:
2000 – 0,669
2005 – 0,699
2012 – 0,730

42. Mortalidade Infantil:
2002 – 25,3 em 1000 nascidos vivos
2012 – 12,9 em 1000 nascidos vivos

43. Gastos Públicos em Saúde:
2002 – 28 bi
2013 – 106bi

44. Gastos Públicos em Educação:
2002 – 17 bi
2013 – 94 bi

45. Estudantes no Ensino Superior:
2003 – 583.800
2012 – 1.087.400

46. Risco Brasil (IPEA):
2002 – 1.446
2013 – 224

47. Operações da Polícia Federal:
Governo FHC – 48
Governo PT – 1.273 (15 mil presos)

48. Varas da Justiça Federal:
2003 – 100
2010 – 513

49. 38 milhões de pessoas ascenderam à Nova Classe Média (Classe C).

50. 42 milhões de pessoas saíram da miséria.

FONTES:
47/48 – http://www.dpf.gov.br/agencia/estatistica
39/40 – http://www.washingtonpost.com
42 – OMS, Unicef, Banco Mundial e ONU
37 – índice de GINI: http://www.ipeadata.gov.br
45 – Ministério da Educação
13 – IBGE
26 – Banco Mundial

http://www.hildegardangel.com.br/?p=41715

segunda-feira, 10 de agosto de 2015

EU ERA MAIS À ESQUERDA MAS, DIANTE DO QUE VEJO, EU ME RENDO


Eu nem era tão Lula assim. Sou mais à esquerda mas, votei nele em 2002. Contudo, esperava mais, muito mais. Tolice. Em um Brasil com a pior e mais podre elite política e social do mundo, com parte de uma classe média fascista, que já depôs presidente popular, que já fez presidente popular suicidar, esse homem, sem derramar sangue, sem criar abalos, esse homem fez a mais profunda reforma na estrutura social brasileira - votei nele em 2006 novamente.
Eu nem era tão Dilma assim. Sou mais à esquerda. Mas, votei nela em 2010. Todavia, esperava mais. Mas, veja: Dilma enfrentou Globo, enfrentou Veja, enfrentou fascistas. E ganhou. E venceu o golpe sujo da direita brasileira. Aprofundou a reforma na estrutura social brasileira. E então lembrei-me - é a mesma que venceu câncer, que venceu torturadores, que venceu ditadura. E permanece com um governo admirado pelo mundo inteiro. E amada por seu povo (falei povo). Acredita, firmemente, que é possível fazer deste país um país justo. Enquanto os abutres da direita, almas pequenas, enlouquecem ao perceberem que, embora façam de tudo, não atingem a nobre dama - votei nela em 2014 novamente.
Eu nem era tão PT assim. Sou mais à esquerda. Entretanto, tenho visto esse partido apanhar inacreditavelmente da parte fascista da sociedade brasileira e manter-se de pé. E com dignidade. Apanha de canal de televisão corrupto, apanha de juiz financiado pelo golpe, apanha de tucanos financiados pelos EUA, apanha da máfia. Ninguém resistiria a tudo isso. E no entanto, inacreditavelmente, resistem. Lula mantém o mesmo sorriso de esperança por um Brasil melhor, como no início. A mesma emoção. Dilma segue adiante, realizando um governo voltado para o bem estar do povo. Fazendo do golpe - que derrubaria qualquer um - em algo que não a atinja. Faz crer que o sonho não acabou.
Ambos, Lula e Dilma, tiraram milhões da miséria. Deram nova perspectiva à sociedade brasileira. Fizeram do Brasil um país do presente.
Volto às urnas em 2018 para votar no Lula. Entendendo que, finalmente, depois de 500 anos, minha pátria encontrou seu caminho.

Walter Ferreira é funcionário público, bacharel em Direito e fazendo licenciatura em História (não recebe bolsa-família, é de esquerda e vota no PT)

terça-feira, 4 de agosto de 2015

Prisão de Dirceu desnuda a Lava Jato

A prisão preventiva do ex-ministro da Casa Civil não é apenas decisão arbitrária, sem provas e motivos razoáveis, o que já bastaria para ser fortemente questionada.

Além de estar sob regime de prisão domiciliar, à disposição da Justiça, os próprios procuradores alegam que a incriminação contra o líder petista está exclusivamente apoiada sobre duas delações premiadas cujas provas de verificação sequer foram colhidas.

O juiz Sérgio Moro deu guarida à tese da ilegalidade dos contratos de consultoria da JD Associados com empreiteiras ligadas a Petrobras, no valor de R$ 9,5 milhões em oito anos, porque dois réus confessos, em troca de eventuais benefícios, Milton Pascowitch e Júlio Camargo, afirmaram se tratar de propinas disfarçadas.

A questão central é entender os motivos que levam Moro e seus aliados por um caminho que afronta garantias constitucionais.

Sinais de manobra política são evidentes.

Como já havia ocorrido com a detenção de João Vaccari, a nova reclusão do principal líder da história petista, depois de Lula, é efetivada praticamente às vésperas do programa nacional do PT ir ao ar, o que está previsto para o próximo dia 6.

Também serve de combustível para as manifestações da direita, convocadas para 16 de agosto.

Um terceiro objetivo igualmente sobressai: tirar Eduardo Cunha do centro das denúncias, arrastando o PT e os governos Lula-Dilma para a linha de tiro, mais uma vez usando José Dirceu como símbolo e alvo.

O mais importante, porém, é que a prisão do ex-chefe da Casa Civil foi anunciada pela Procuradoria-Geral da República e pela Polícia Federal através de narrativa que dá cavalo de pau na caracterização da Operação Lava Jato.

Antes, a explicação predominante era que se tratava de cartel empresarial na Petrobras, pagando suborno para diretores da empresa e fazendo repasses clandestinos para partidos políticos.

Agora, na versão dos procuradores, fala-se de esquema criado pelo primeiro governo Lula, sob o comando de José Dirceu, para comprar apoio parlamentar. Uma espécie de segundo “mensalão”, digamos.

Não precisa de muito esforço para registrar que estamos diante de sorrateiro enredo, cuja meta essencial é desgastar o ex-presidente da República e, talvez, levá-lo aos tribunais e à prisão.

Possivelmente não irá demorar para ser apresentado o próximo capítulo: se José Dirceu, então ministro, montou o suposto “esquema de propina”, que teria sobrevivido depois de sua saída do ministério, quem teria ordenado a continuidade da operação?

Perguntarão os roteiristas da Lava Jato e seus apaniguados: quem seria o chefe do chefe?

Os abutres da oposição de direita, aliás, já surfam nesta onda, arremessando contra Lula e Dilma.

Se o governo e o PT não saírem da pasmaceira e continuarem a validar, com a cabeça debaixo da terra, os movimentos da República de Curitiba, claramente comprometidos com as forças mais conservadoras do país, logo será tarde demais para defender o processo de mudanças iniciado em 2003 e seu líder histórico.

A política aceita quase qualquer coisa, menos a humilhação de quem decide, por covardia ou erro de cálculo, perder sem lutar.

Breno Altman

segunda-feira, 27 de julho de 2015

Como o Brasil vai se imbecilizando com uma mídia imbecil


27 de julho de 2015 | 22:34 Autor: Fernando Brito

“Os principais veículos da imprensa se transformaram em panfletos políticos e vasculhar o noticiário em busca de jornalismo que valha uma referência tem sido como buscar um fio de cabelo no palheiro”.
A frase, parte da despedida do excepcional comentário radiofônico de Luciano Martins Costa, do Observatório da Imprensa, é um triste retrato do que restou a nós que, sem estruturas profissionais suficientes para produzir apuração própria de informações no dia-a-dia, queimamos a nossa escassa mufa comentando o que se passa na imprensa brasileira.
A coisa ficou tão rastaquera que, só de sexta-feira para cá, há uma coleção de bobagens nos jornais brasileiros que deixaria exausta uma reencarnação de Sérgio Porto e seu Stanislau Ponte Preta, com o Festival de Besteiras que Assola o País.
Fernando Rodrigues, por exemplo, encontra o desenho de uma metralhadora na planta do prédio do presídio para o qual foram transferidos os presos da Operação Lava Jato. Tome de imaginação…O resto é um “tour” por celas e corredores, numa edificante versão cult dos programas “mundo cão” que infestam a TV brasileira nas tardes desocupadas…
A Veja dá capa sobre a iminente “delação premiada” de um dirigente de empreiteira que a defesa do dito cujo diz nem estar em cogitação e que, se estiver sendo negociada por terceiros, seria motivo para o abandono do processo…
Mentiu-se e desmentiu-se um suposto encontro entre Lula, Dilma e FHC, episódio encerrado com uma nota desprovida de ferraduras deste último.
Transformaram-se simples gravuras em “pinturas de alto valor” doadas a José Sergio Gabrielli e Graça Foster na Petrobras.
Ah, sim, esqueci de citar que a Polícia Federal, o Ministério Público e o Dr. Sérgio Moro desconfiam que Marcelo Odebrecht, depois de um ano dedicado a escrever mensagens e bilhetes que seriam comprometedores, iria fugir para o exterior…
Não sei se a Operação Lava Jato produziu uma queda de 1% no PIB, como disse hoje a presidenta Dilma Rousseff, mas certamente isso não foi um décimo o que ela derrubou da inteligência nacional, se é que ainda é possível incluir nela a imprensa brasileira.
O império do ódio, do maniqueísmo, da intolerância e da imbecilidade tomou conta de uma parcela da elite brasileira e da parcela que a orbita nos meios de comunicação, inclusive hoje.
De tal modo e com tanta força que é preciso buscar nas profundezas do povo o remédio para enfrentar o lixo tóxico que formou uma multidão de zumbis.

sábado, 25 de julho de 2015

Aviso aos que atacam o SUS: ser mordido de cobra nos EUA pode custar US$ 153 mil No Brasil, não custaria nada, porque o país trata o ofidismo, há mais de um século, como um problema de saúde pública.




Fernando Brito - Tijolaço (via Revista Fórum)

Quando li, achei que era destas “histórias da internet”. Mas saiu no insuspeito Washington Post:

O americano Todd Fassler foi mordido por uma cascavel em San Diego, Califórnia.

Não seria notícia, porque há entre sete e oito mil ataques de cobras peçonhentas nos Estados Unidos todo ano. Aqui, em 2010, o número chegava, em 2010, a 30 mil vítimas.

Mas virou, quando uma emissora local noticiou quanto isso custou a Fassler em custo de hospital e de soro antiofídico: US$ 153.161,25, ou R$ 483 mil, na cotação de ontem.

Como diz o título da reportagem do Post, “Esta mordida de cascavel de $ 153,000 é tudo de errado com os serviços de saúde (norte) americanos“

Aqui, é claro, não custaria nada, porque o Brasil trata o ofidismo, há mais de um século, como um problema de saúde pública. E construiu, com esforço, uma rede de produção e distribuição de soros – pelos quais cobraram US$ 83 mil ao americano – que dão o sentido de heroísmo ao trabalho de gente como Vital Brazil, o grande marco nesta história, com um esforço que ele próprio descreve, na virada do século 19, quando comprovou a necessidade de soros específicos para cada espécie de serpente, desbancando o conhecimento europeu que produzia soros de baixa efetividade.

“Não dispondo o Instituto de verba para a aquisição de serpentes, tive eu mesmo de assumir o encargo. Em pequeno terreno adquirido próximo a minha residência, mandei construir meu primeiro serpentário, bastante imperfeito, o qual serviu-me de orientação quando mais tarde tive que construir outros em Butantan. Nesse período trabalhei intensamente na aquisição de serpentes e na propaganda entre agricultores amigos, dos meios de captura e transporte dos ofídios, distribuído-lhes laços e caixas”.

A saúde pública no Brasil ainda bem, sempre contou com gente abnegada como ele.

Quem enche a boca para ver só os defeitos no Sistema Único de Saúde do Brasil deve tomar cuidado para não morder a língua, um dia destes.

Pode ser pior que o veneno da cascavel.

Pode ser sua própria vida.

Brasil, Petróleo, Geopolítica e MUITA SABOTAGEM

segunda-feira, 13 de julho de 2015

A farsa do aquecimento global antropogênico


Rumo a uma política climática baseada em constatações e bom senso
Published 29 janeiro 2015 Aquecimento Global
Carta aberta ao Ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação

São Paulo, 26 de janeiro de 2015

Exmo. Sr.
José Aldo Rebelo Figueiredo
Ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação

As posições críticas de V.Exa. sobre a tendência prevalecente nas questões climáticas, que atribui às atividades humanas uma suposta e não comprovada influência na dinâmica do clima nos últimos dois séculos, são de domínio público e têm motivado questionamentos à vossa nomeação para o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), tanto no Brasil como no exterior.

Assim sendo, os signatários da presente reiteram que as discussões e a formulação das políticas públicas sobre as questões climáticas têm sido pautadas, predominantemente, por equivocadas e restritas motivações ideológicas, políticas, econômicas e acadêmicas – o que as têm afastado não apenas dos princípios basilares da prática científica, mas também dos interesses maiores das sociedades de todo o mundo, inclusive a brasileira.

Estamos conscientes de que a extensão de tais interesses específicos e dos compromissos internacionais assumidos pelo País com a agenda da “descarbonização” da economia mundial faz com que qualquer tentativa de reorientação da pauta climática nacional, para fora do cenário “antropogênico” das mudanças climáticas, tende a gerar uma forte oposição dos setores articulados em torno desse cenário, aí incluídos o poderoso movimento ambientalista internacional e grande parcela da mídia, dotados de considerável influência sobre a opinião pública interna e externa.

Não obstante, acreditamos que algumas necessárias correções de rumo sejam factíveis, no sentido de se atribuir uma prioridade maior a certas iniciativas de importância fundamental, tanto na alçada do MCTI como na de outros ministérios (casos nos quais a influência do MCTI poderia ser determinante), para proporcionar uma melhora do conhecimento da dinâmica climática e um aumento da capacidade geral da sociedade para fazer frente aos fenômenos meteorológicos e climáticos. Estamos convencidos de que tais iniciativas representariam aplicações melhores para grande parte dos recursos humanos e financeiros que têm sido equivocadamente orientados para a agenda da “descarbonização”.

Por conseguinte, oferecemos-lhe as considerações a seguir, com a expectativa de que possam aportar subsídios relevantes para a atuação do MCTI nessa área.

1) Não há evidências físicas da influência humana no clima global

Em termos estritamente científicos, a questão climática pode ser sintetizada em um único parágrafo:

As mudanças constituem a característica fundamental do clima, como demonstram as evidências referentes a toda história geológica da Terra – ou seja, o clima está sempre em mudança. Quanto à alegada influência humana no clima global, supostamente atribuída às emissões de compostos de carbono das atividades humanas, com a industrialização e a urbanização, ela teria que, forçosamente, amplificar as taxas de variação (gradientes) das temperaturas atmosféricas e oceânicas e dos níveis do mar, registradas desde a Revolução Industrial do século XVIII. Como não há qualquer evidência de que estas variações sejam anômalas, em relação às registradas anteriormente, no passado histórico e geológico, simplesmente, a propalada influência humana não pode ser comprovada.

Todos os prognósticos que indicam elevações exageradas das temperaturas e dos níveis do mar nas décadas vindouras, além de outros impactos negativos atribuídos ao lançamento de carbono “antropogênico” na atmosfera, baseiam-se em projeções de modelos matemáticos, que constituem apenas simplificações limitadas do sistema climático. Portanto, tais prognósticos não devem ser usados para fundamentar políticas públicas e estratégias de longo alcance, com grandes impactos socioeconômicos, tanto em âmbito nacional como global.

A influência humana no clima restringe-se às áreas urbanas e seus entornos, em situações específicas de calmarias, sendo esses impactos muito localizados e sem influência na escala planetária.

Segundo o quinto relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), divulgado em 2014, as temperaturas médias globais aumentaram 0,85 °C no período 1880-2012, enquanto o nível médio do mar subiu 0,19 m entre 1901 e 2010.

Na história da Terra há registros de situações bem mais dramáticas. Ao longo do Holoceno, a época geológica correspondente aos últimos 12.000 anos em que a civilização humana se desenvolveu, houve diversos períodos com temperaturas mais altas que as atuais. No Holoceno Médio, há 6.000-8.000 anos, as temperaturas médias chegaram a ser 2 °C a 3 °C superiores às atuais, enquanto os níveis do mar atingiram até 3 metros acima do atual. Igualmente, nos períodos quentes conhecidos como Minoano (1500-1200 a.C.), Romano (séc. III a.C.-V d.C.) e Medieval (séc. X-XIII d.C.), as temperaturas foram mais de 1oC superiores às atuais.

Entre 12.900 e 11.600 anos atrás, no período frio denominado Dryas Recente, as temperaturas atmosféricas caíram cerca de 8 °C em menos de 50 anos e, ao término dele, voltaram a subir na mesma proporção em pouco mais de meio século.

Quanto ao nível do mar, ele subiu cerca de 120 metros, entre 18.000 e 6.000 anos atrás, o que equivale a uma taxa média de 1 metro por século, suficientemente rápida para impactar visualmente as gerações sucessivas das populações que habitavam as margens continentais. No período entre 14.650 e 14.300 anos atrás, há registros de uma elevação ainda mais acelerada, atingindo cerca de 14 metros em apenas 350 anos, média de 4 metros por século.

Ou seja, tais variações representam valores de uma ordem de grandeza superior às observadas desde o século XIX. Por conseguinte, estas últimas se enquadram com muita folga dentro da faixa de oscilações naturais dos parâmetros climáticos e, portanto, não podem ser atribuídas ao uso dos combustíveis fósseis ou a qualquer outro tipo de atividade vinculada ao desenvolvimento humano.

Embora evidências como essas possam ser encontradas em, literalmente, milhares de estudos realizados em todos os continentes por cientistas de dezenas de países, devidamente publicados na literatura científica internacional, é raro que algum destes estudos ganhe repercussão na mídia, quase sempre mais inclinada à promoção de um alarmismo sensacionalista e desorientador.

2) A hipótese “antropogênica” é um desserviço à Ciência e um risco para as políticas públicas

A boa prática científica pressupõe uma correspondência entre hipóteses e dados observados que as comprovem. Como a hipótese das mudanças climáticas “antropogênicas” não se fundamenta em evidências físicas observadas no mundo real, a insistência na sua preservação representa um grande desserviço à Ciência e à sua necessária colocação a serviço do bem estar da humanidade. Apesar de agregar um certo número de cientistas, a construção dessa hipótese passa ao largo da metodologia científica.

A História registra numerosos exemplos dos efeitos nefastos do atrelamento da Ciência a ideologias e outros interesses restritos. O empenho prevalecente na imposição da hipótese “antropogênica” sem as evidências correspondentes tem custado caro à humanidade, em recursos humanos, técnicos e econômicos desperdiçados com um problema inexistente. O Brasil não está alheio a essa situação. Ao contrário, manifesta-se no País um despropositado empenho em colocá-lo em uma questionável posição de “liderança” nas negociações internacionais sobre o clima.

Vale lembrar que países como o Canadá, Japão, Austrália e Rússia, já manifestaram a sua posição contrária em prosseguir pelo caminho da “descarbonização”, de forma a não permitir que uma premissa não comprovável sirva para nortear políticas públicas de tão amplo espectro e de mudanças radicais em suas economias.

Ademais, ao conferir ao dióxido de carbono (CO₂) e outros gases produzidos pelas atividades humanas o papel de principais protagonistas da dinâmica climática, a hipótese “antropogênica” simplifica e distorce processos naturais extremamente complexos, nos quais interagem fatores astrofísicos, atmosféricos, oceânicos, geológicos, geomorfológicos e biológicos, que a Ciência apenas começa a entender em sua abrangência.

Um exemplo dos riscos dessa simplificação para a formulação das políticas públicas relevantes é a possibilidade real de que o período até a década de 2030 experimente um considerável resfriamento da atmosfera, em vez de aquecimento, devido ao efeito combinado de um período de baixa atividade solar (Ciclo 25) e de uma fase de resfriamento do Oceano Pacífico (Oscilação Decadal do Pacífico-ODP), em um cenário semelhante ao observado entre 1947 e 1976. Vale observar que, naquele período, o Brasil experimentou uma redução de 10-30% nas chuvas, o que acarretou problemas de abastecimento de água e geração elétrica, além de um aumento das geadas fortes, que muito contribuíram para erradicar o cultivo do café no oeste do Paraná. Se tais condições se repetirem, no futuro imediato, o País poderá ter sérios problemas, inclusive nas áreas de expansão da fronteira agrícola das regiões Centro-Oeste, Norte e Nordeste, e na geração hidrelétrica (particularmente, considerando a proliferação de reservatórios “a fio d’água”, impostos pelas restrições ambientais). E, embora sejam necessários estudos aprofundados para comprová-la, não pode ser descartada a possibilidade de a atual seca que atinge o Sudeste estar relacionada a um novo estado climático semelhante ao de 1947-1976.

Além disso, a obsessão com o CO₂ desvia as atenções das emergências e prioridades ambientais reais, cuja solução requer iniciativas e investimentos públicos. Um exemplo é a indisponibilidade de sistemas de saneamento básico para mais da metade da população mundial, cujas consequências constituem, de longe, o principal problema ambiental do planeta – e do próprio Brasil, onde os números são semelhantes. Outro é a falta de acesso à eletricidade, que atinge mais de 1,5 bilhão de pessoas, principalmente na Ásia, África e América Latina.

A propósito, o decantado limite de 2 °C para a elevação das temperaturas sobre os níveis pré-industriais, que, supostamente, não poderia ser superado e tem justificado todas as restrições propostas para os combustíveis fósseis, em âmbito internacional, também não tem qualquer base científica. Trata-se de uma criação “política” do físico Hans-Joachim Schellnhuber, diretor do Instituto Potsdam para a Pesquisa de Impactos Climáticos (PIK) e assessor científico do governo alemão, como admitido por ele próprio, em uma entrevista à revista Der Spiegel (publicada em 17/10/2010).

3) Prioridades reais: melhor conhecimento da dinâmica climática e maior resiliência da sociedade

Em lugar do alarmismo sobre o aquecimento global e da pseudopanaceia do “baixo carbono”, a política setorial brasileira teria muito a ganhar com uma reorientação de prioridades, que favoreça: a) um melhor conhecimento da dinâmica climática, com ênfase nos estudos paleoclimáticos do território brasileiro; e b) um aumento da resiliência da sociedade para fazer frente aos eventos meteorológicos extremos e a quaisquer tendências climáticas que se manifestem no futuro.

O estudo das mudanças climáticas do passado histórico e geológico (paleoclimas) constitui a base mais sólida para o entendimento da dinâmica climática e as suas projeções para o futuro. Uma atenção especial deve ser dada ao período Quaternário (os últimos 2,6 milhões de anos), no qual o gênero Homo surgiu e tem evoluído. Dentro do Quaternário, os últimos 800 mil anos têm sido marcados por uma sucessão de ciclos glaciais (mais frios), com duração média de 90-100 mil anos, e interglaciais (mais quentes), com duração média de 10-12 mil anos. Atualmente, o planeta se encontra em uma fase interglacial, que teve início há cerca de 11.600 anos, dentro da qual toda a civilização humana tem se desenvolvido. De forma significativa, pelo menos os três interglaciais anteriores foram mais quentes que o atual, e não há qualquer evidência de que este possa deixar de ser sucedido por uma nova glaciação. A explicação mais aceita sobre os fatores causadores dessa dinâmica se baseia em alterações de parâmetros orbitais terrestres que variam ciclicamente, como mudanças na inclinação do eixo de rotação e na forma da órbita terrestre ao redor do Sol. Portanto, é evidente que o homem é incapaz de causar qualquer ínfima influência nos fatores e forças cósmicas que a regem.

No Brasil, os estudos do Quaternário, apesar de importantes e da existência de um número razoável de instituições de pesquisa e pesquisadores dedicados a eles, ainda são esparsos e insuficientes para permitir a configuração de um quadro paleoclimático do território nacional e do seu entorno continental, com a profundidade necessária para subsidiar um modelo consistente de mudanças climáticas a ser definido para o País, que possa proporcionar dados relevantes para subsidiar um modelo global. Portanto, esta é uma lacuna que precisa ser devidamente considerada, na formulação da política climática nacional, em que o MCTI poderia atuar em consonância com os órgãos específicos do Ministério de Minas e Energia (MME).

Quanto à resiliência, esta pode ser entendida como a flexibilidade das condições físicas de sobrevivência e funcionamento da sociedade, além da sua capacidade de resposta às emergências, permitindo-lhe reduzir a sua vulnerabilidade aos fenômenos meteorológicos extremos, às oscilações climáticas e a outros fenômenos naturais potencialmente perigosos que já ocorreram no passado e certamente ocorrerão no futuro.

Neste aspecto, destacamos dois conjuntos de fatores, dentro da alçada direta do MCTI:
a) um aprimoramento da capacidade de previsão meteorológica nacional;
b) estímulo de pesquisas referentes às seguranças alimentícia e hídrica, assim como a novas fontes energéticas, que contribuam para reduzir a vulnerabilidade da sociedade às adversidades climáticas.

No primeiro item, uma iniciativa primordial seria tirar do papel o projeto de um satélite meteorológico próprio, imprescindível para um país que ocupa a metade da América do Sul e tem a responsabilidade de distribuir informações meteorológicas sobre grande parte do Oceano Atlântico Sul (a chamada METAREA-V), nos termos da Convenção Internacional para a Salvaguarda da Vida Humana no Mar (SOLAS). Na edição de 2012 do Programa Nacional de Atividades Espaciais (PNAE), o satélite está previsto para 2018, mas os atrasos recorrentes do programa tornam tal prazo improvável, além de imprevisível.

Outros exemplos poderiam incluir:
• a ampliação e melhor distribuição territorial da rede de estações meteorológicas, inferior aos padrões recomendados pela Organização Meteorológica Mundial (OMM) para um território com as dimensões do brasileiro, com ênfase especial no trabalho que vem sendo desenvolvido pelo Instituto Nacional de Meteorologia (INMET);
• o aumento do número de radares meteorológicos e a sua interligação aos sistemas de defesa civil;
• a aceleração da consolidação da base nacional de dados meteorológicos, boa parte dos quais ainda não foi digitalizada;
• o estabelecimento de uma rede efetiva de divulgação de dados meteorológicos e oceanográficos para a METAREA-V.

No segundo item, poderíamos destacar:
• a ampliação das pesquisas com sementes geneticamente modificadas para todo tipo de condições climáticas, em curso na Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e outras instituições do gênero;
• o estabelecimento de linhas de pesquisa de novas fontes energéticas não-renováveis, como o uso de tório em reatores nucleares, e fontes baseadas em novos princípios físicos, como magnetohidrodinâmica, reações nucleares quimicamente assistidas (a chamada “fusão a frio”), energia do vácuo quântico e outras, que têm sido contempladas no exterior, mas são praticamente ignoradas no País;
• dentre as energias renováveis, a geração de bioenergia, como maior eficiência na queima de resíduos vegetais, etanol de segunda geração e óleos de palmáceas nativas (OVP), muito abundantes no País, e que podem ser queimados diretamente em motores diesel convencionais sem necessidade de modificação dos motores ou dos óleos vegetais.

Para tais pesquisas energéticas, o Brasil dispõe dos necessários recursos humanos qualificados, distribuídos entre centros de pesquisa acadêmicos, de empresas estatais (Cenpes, Cepel etc.), militares (IME, CTA, CTEx, IPqM) e um número considerável de empresas privadas de tecnologia.

Todas essas iniciativas poderiam se beneficiar com a disponibilidade de parte dos recursos financeiros que têm sido alocados a programas vinculados às mudanças climáticas, segundo o enfoque equivocado da redução das emissões de carbono (como muitos dos projetos contemplados no âmbito do chamado Fundo Clima, gerido pelo MCTI e o Ministério do Meio Ambiente, MMA).

Um grupo adicional de iniciativas relevantes para a “resiliência climática” envolve a infraestrutura física, em especial, a capacidade de armazenamento de alimentos, infraestrutura de transportes, energia e comunicações, além de outros tópicos, não diretamente na alçada do MTCI, mas potencialmente influenciados pelas diretrizes e programas do Ministério.

Em síntese, o caminho mais racional e eficiente para aumentar a resiliência da sociedade, diante das mudanças climáticas inevitáveis – aquecimento ou resfriamento –, é a elevação geral dos seus níveis de desenvolvimento humano e progresso aos patamares permitidos pela Ciência e pelo avanço do conhecimento e o processo de inovação.

4) A “descarbonização” é desnecessária e deletéria

Uma vez que as emissões “antropogênicas” de carbono não provocam impactos verificáveis no clima global, toda a agenda da “descarbonização” ou “economia de baixo carbono” se torna desnecessária e contraproducente – sendo, na verdade, uma pseudo-solução para um problema inexistente, pelo menos no tocante ao clima (programas de incentivo à mobilidade urbana, inclusos no Fundo Clima, por exemplo, se justificam por si próprios). A insistência na sua preservação, por força da inércia do status quo, não implicará em qualquer efeito sobre o clima, mas tenderá a aprofundar os numerosos impactos negativos de tais diretrizes.

O principal deles é o encarecimento desnecessário de uma série de atividades econômicas, em razão de:
• os subsídios concedidos à exploração de fontes energéticas de baixa eficiência, como a eólica e solar, já em retração na União Europeia (UE), que investiu fortemente nelas;
• a imposição de cotas e taxas vinculadas às emissões de carbono, como fez a UE para viabilizar o seu mercado de créditos de carbono, e a Austrália, onde a grande rejeição popular à taxa imposta levou o atual governo do país a retirá-las;
• a imposição a várias atividades econômicas de medidas de captura e sequestro de carbono (CCS), totalmente inúteis sob o ponto de vista climático e de saúde pública, uma vez que o CO₂ não é um gás tóxico e poluente.

Os principais beneficiários de tais medidas têm sido os especuladores, fornecedores de equipamentos e serviços de CCS e participantes dos intrinsecamente inúteis mercados de carbono, que não têm qualquer fundamento econômico real e se sustentam tão-somente em uma demanda artificial criada a partir de uma necessidade inexistente.

5) No futuro, menos alarmismo e mais Ciência e bom senso

Pela primeira vez na História, a humanidade detém um acervo de conhecimentos e recursos físicos, técnicos e humanos, para prover a virtual totalidade das necessidades materiais de uma população ainda maior que a atual. Esta perspectiva viabiliza a possibilidade de se universalizar – de uma forma inteiramente sustentável – os níveis gerais de bem estar usufruídos pelos países mais avançados, em termos de infraestrutura de água, saneamento, energia, transportes, comunicações, serviços de saúde e educação e outras conquistas da vida civilizada moderna. A despeito dos falaciosos argumentos contrários a tal perspectiva, os principais obstáculos à sua concretização, em menos de duas gerações, são mentais e políticos, e não físicos e ambientais.

Aproveitamos o ensejo para lhe desejar sucesso em sua gestão, esperando que ela contribua de forma decisiva para consolidar na sociedade brasileira a conscientização do papel estratégico do conhecimento e da inovação para o desenvolvimento socioeconômico do País. E, da mesma forma, esperamos que ela sinalize uma inflexão determinante para que, em um futuro próximo, a agenda climática nacional venha a ser posicionada, definitivamente, no terreno sólido das evidências científicas reais e do bom senso.

Kenitiro Suguio
Geólogo, Doutor e Livre-docente em Geologia
Professor Emérito do Instituto de Geociências da Universidade de São Paulo (USP)
Membro titular da Academia Brasileira de Ciências

Luiz Carlos Baldicero Molion
Físico, Doutor em Meteorologia e Pós-doutor em Hidrologia de Florestas
Pesquisador Sênior (aposentado) do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE)
Professor Associado (aposentado) da Universidade Federal de Alagoas (UFAL)

José Carlos Parente de Oliveira
Físico, Doutor em Física e Pós-doutor em Física da Atmosfera
Professor Associado (aposentado) da Universidade Federal do Ceará (UFC)
Professor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE)

Fernando de Mello Gomide
Físico, Professor Titular (aposentado) do Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA)
Co-autor do livro Philosophy of Science: Brief History (Amazon Books, 2010, com Marcelo Samuel Berman)

José Bueno Conti
Geógrafo, Doutor em Geografia Física e Livre-docente em Climatologia
Professor Titular do Departamento de Geografia da Universidade de São Paulo (USP)

Francisco Arthur Silva Vecchia
Engenheiro de Produção, Mestre em Arquitetura e Doutor em Geografia
Professor Associado do Departamento de Hidráulica e Saneamento da Escola de Engenharia de São Carlos (EESC–USP)
Diretor do Centro de Ciências da Engenharia Aplicadas ao Meio Ambiente (CCEAMA) da EESC–USP

Gildo Magalhães dos Santos Filho
Engenheiro eletrônico, Doutor em História Social e Livre-docente em História da Ciência e Tecnologia
Professor Associado do Departamento de História da Universidade de São Paulo (USP)

Lucia Helena Tavares Viegas
Engenheira Química, Mestra em Administração de Empresas e Doutora em Gestão e Inovação Tecnológica

Paulo Cesar Soares
Geólogo, Doutor em Ciências Geológicas e Livre-docente em Estratigrafia
Professor Titular da Universidade Federal do Paraná (UFPR)

Marco Antonio Sacilotti
Físico, Mestre em Física Aplicada e Doutor em Engenharia Elétrica
Professor das universidades UFR-Sciences et Tecnhologies/Université de Bourgogne (França)
Professor Visitante do Departamento de Física da Universidade Federal de Pernambuco (DF-UFPE)

Ricardo Augusto Felicio
Meteorologista, Mestre e Doutor em Climatologia
Professor do Departamento de Geografia da Universidade de São Paulo (USP)

Fulvio Cupolillo
Geógrafo, Mestre em Meteorologia Agrícola e Doutor em Geografia
Professor Titular do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Minas Gerais (IFMG)

Gustavo Macedo de Mello Baptista
Geógrafo, Mestre em Tecnologia Ambiental e Recursos Hídricos e Doutor em Geologia
Diretor do Centro de Estudos Avançados Multidisciplinares da Universidade de Brasília (UnB)
Autor do livro Aquecimento Global: ciência ou religião? (Hinterlândia, 2009)

João Bosco A. de Morais
Geólogo, Mestre em Hidrogeologia e Doutorando em Vulnerabilidade de Aquíferos na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE)
Assessor para Meio Ambiente do Governo do Estado do Ceará

Cássio Roberto da Silva
Geólogo, Especialista em Geologia Ambiental, Mestre em Geologia Econômica e Doutor em Geologia Médica
Pesquisador em Geociências (Sênior) e chefe do Departamento de Gestão Territorial do Serviço Geológico do Brasil – CPRM

Ricardo Moacyr de Vasconcellos
Engenheiro de Minas, Especialista em Geofísica
Pesquisador em Geociências (Sênior) do Serviço Geológico do Brasil – CPRM

Paulo Cesar Martins Pereira de Azevedo Branco
Geólogo
Pesquisador em Geociências (Sênior) do Serviço Geológico do Brasil – CPRM

Maria Angélica Barreto Ramos
Geóloga, Mestra em Geociências
Pesquisadora em Geociências (Sênior) do Serviço Geológico do Brasil – CPRM

Ginaldo Caldas Raymundo
Geólogo, Mestre em Geologia de Engenharia
(Empresa privada de engenharia consultiva)

Daniela de Souza Onça
Geógrafa, Mestra e Doutora em Climatologia
Professora da Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC)

Gustavo Zen de Figueiredo Neves
Geógrafo, Mestre em Ciências da Engenharia Ambiental
Professor da Universidade Estadual de Goiás (UEG)

Marcos José de Oliveira
Engenheiro Ambiental, Mestre e Doutorando em Ciências da Engenharia Ambiental na Universidade de São Paulo (USP)

Elis Dener Lima Alves
Geógrafo, Mestre em Física Ambiental e Doutorando em Ciências da Engenharia Ambiental na Universidade de São Paulo (USP)

Igor Vaz Maquieira
Biólogo, Especialista em Gestão Ambiental

Geraldo Luís Saraiva Lino
Geólogo
Coeditor do sítio Alerta em Rede
Autor do livro A fraude do aquecimento global: como um fenômeno natural foi convertido numa falsa emergência mundial (Capax Dei, 2009)

Carlos Eduardo Osório Ferreira
Mestre em Geologia de Engenharia e Ambiental UFRJ
Pesquisador em Geociências (sênior)do Serviço Geológico do Brasil

Sandra Fernandes da Silva
Geóloga, Especialista em Risco Geológico e Doutora em Geotecnia
Pesquisadora em Geociências do Serviço Geológico do Brasil – CPRM